Boletim Jurídico – Publicações Online

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Direito Administrativo / Notícias

A (in) eficácia da Lei nº 4730/2019 na relação público-privada no Estado do Amazonas, Sob a ótica do aumento de casos de corrupção no Estado

RESUMO

Na observação do cenário catastrófico na relação entre agentes da iniciativa privada e da Administração Pública no estado do Amazonas, deu-se origem ao objetivo do presente artigo, especialmente na análise da eficácia da Lei Estadual nº 4.730/18 – Lei de Compliance, na qual regulamenta a relação supracitada e tem como finalidade a prevenção aos casos de corrupção. Por meio do método dissertativo realizou-se uma pesquisa bibliográfica, a fim de trazermos para o presente estudo, um breve histórico da ética nas ciências políticas, passando pelo surgimento da governança (1980), pelo advento da Lei nº 8.429, chamada de lei de Improbidade, até ao movimento ético que hoje chamamos de Compliance, que significa agir em conformidade, indo além de acatar normas, chegando a pleitear mudanças culturais. Ademais, faz-se necessário o registro que o negócio comercial estabelecido da relação público-privada tem obrigatoriamente que amparar a integralidade desta aos princípios pilares constitucionais. Desta feita, este estudo fará o cruzamento da plena eficácia da Lei 4.730/18 e os casos alarmantes de desvio de dinheiro público, que nos últimos anos temos visto no estado. Cruzando ainda com a eficiência e transparência da modalidade de licitação “Pregão Eletrônico”. Demonstrando que na real eficácia da referida lei e a importância do acatamento desta na de futuros casos similares.

Palavras Chaves: Transparência, Corrupção, Amazonas, Compliance.

ABSTRACT

In observing the catastrophic scenario in the relationship between agents of the private sector and Public Administration in the state of Amazonas, the objective of this article was given rise, especially in the analysis of the effectiveness of State Law No. 4,730 / 18 – Compliance Law, in which regulates the aforementioned relationship and defaults corruption cases as a standard. Through the dissertation method, a bibliographic research was promoted, in order to bring to this study a brief history of ethics in the political sciences, including the emergence of governance (1980), the advent of Law No. 8,429, called the law of Improbity, even the ethical movement that we now call Compliance, which means acting in accordance, going beyond complying with rules, reaching cultural changes to plead. In addition, it is necessary to register that the commercial business established in the public-private relationship must support the integrality of the constitutional pillar principles. This time, this study will cross-check the full effectiveness of Law 4.730 / 18 and the alarming cases of embezzlement of public money, which we have seen in the state in recent years. Crossing with the efficiency and transparency of the “Electronic Auction” bidding modality. Demonstrating that in the real easing of the law and the importance of complying with it in future similar cases.

Keywords: Transparency, Corrupion, Amazonas, Compliance.

INTRODUÇÃO

Sabemos que a corrupção no cenário político em nosso país, é algo infelizmente tão habitual, que salvo em casos de extrema relevância, esta passa-se como “normalidade”, ou como o famoso: “Jeitinho Brasileiro”.

Grandes potências econômicas como EUA e Europa, já desde meados de 1970 vinham experimentando culturas de conformidades, e, o que temos hoje como Compliance. Porém, no Brasil, tal movimento teve seu marco histórico, somente com a Lei de Combate aos Crimes de Lavagem de Dinheiro (Lei 9.613/98). E no estado do Amazonas 10 anos depois, tivemos nosso marco legal na Lei 4.730/2018 – Programa de Integridade nas empresas que contratarem com a Administração Pública do Estado.

É sabido que nos anos de 2014-2017 a Polícia Federal estima desvios de mais de R$ 48 bi de reais no país, no estado do Amazonas tivemos a Operação “Maus Caminhos” que deflagrou desvios de mais de R$ 140 mi de reais em 2018, em 2020 desvio na compra de respiradores durante a pandemia de covid-19, onde houve cerca de 319% de superfaturamento, segundo Ministério Público de Contas-AM, entre dezenas de micro casos abafados pelas mídias e encoberto por “poderosos”.

Há estudos que afirmam que em regiões com menores índices de cultura corruptiva, comprovam-se altos índices de desenvolvimento socioeconômico e educacional. Assim, traçaremos um paralelo entre a cultura corruptiva no estado do Amazonas e o nível de transparência e ética das contas públicas, resultando na análise sobre a (in) Eficácia da Lei Estadual nº 4.730/2018 – Lei de Compliance do Estado do Amazonas.

DESENVOLVIMENTO

Durante toda a história da humanidade, há inúmeros fatos e acontecimentos, os quais nos mostram que a falta de conduta íntegra já se fazia presente. Desde passagens bíblicas, passando por toda ausência da conduta íntegra no período Medieval, chegando até em acontecimentos cotidianos.

Segundo Coelho (2016), apesar de o cenário atual estar bem mais probo que outrora, o start do movimento ético no sentido de uma Administração Pública mais transparente no Brasil, iniciou-se ainda na década de 90. Onde na ocasião da promulgação do Código de Ética Profissional do Servidor Público Civil do Poder Executivo Federal (Decreto 1.171, de 22 de Junho de 1994), assim inovando na responsabilização efetiva dos servidores públicos para com seus atos na Administração Pública.

Neste sentido, Aranha e Martins (1993), narram que apesar de aparentemente serem sinônimos, conceitos de moral e ética tem minúcias as quais os diferenciam, sendo a moral, um conjunto de normas de conduta impostos por uma sociedade, e a ética, uma teoria filosófica ou científica, onde faz a própria reflexão sobre os princípios que fundamentam a moral.

Ao desenrolar de toda a evolução da sociedade, que não mais aceitava o comportamento de seus representantes políticos, tampouco aceitavam apáticos os casos de desvio de dinheiro público em face do descaso com a situação deplorável em que eram administrados os sistemas de saúde e educação pública no Brasil. O autor relata:

“ [..] a exposição midiática das operações policiais que desvelam grandes escândalos de corrupção como, por exemplo, a operação Lava – Jato deixa clara a necessidade de reavaliar as ações do poder público que visam a combater a corrupção no plano normativo e fático”. (COELHO, 2016, p. 04) [grifos nossos]

Neste diapasão, faz-se necessário o resgate do que narra Alexandrino e Paulo (2017) quanto à essência da Administração Pública, onde neste relata que os princípios são o que de fato constituem o alicerce do conjunto de regramentos o qual é construído o ordenamento jurídico.

Assim considerados dentre os capitulados no caput do art. 37 da CF/88, os princípios norteadores do Direito Administrativo (ramo do direito que rege a Administração Pública) são: o princípio da Legalidade, da Impessoalidade, da Moralidade, da Publicidade e da Eficiência. Constituindo assim, uma linha ideal de conduta dos agentes na Administração Pública, quer sejam em quaisquer das 3 esferas dos poderes (Chiavenato, 2013).

O termo Compliance é de origem inglesa, que significa agir de acordo com uma lei, uma norma, uma política interna. O alcance do tema foi se moldando com o passar do tempo, passando a não significar somente cumprir as leis, mas, em especial, cumprir a lei anticorrupção. (SOUZA, LIMA, LUPI, 2019, p. 12)

Candeloro, Rizzo e Pinho (2012, p.30) narram ainda sobre o Compliance, como sendo “um conjunto de regras, padrões, procedimentos éticos e legais, que, uma vez definido e implantado, será a linha mestra que orientará o comportamento da instituição no mercado em que atua”.

Ainda, ALEXANDRINO e PAULO (2017, p. 1056) diz que sob a “perspectiva geral, os atos de improbidade administrativa vitimizam a sociedade brasileira, globalmente considerada”. Desta feita, a Lei nº 8.429/1992 traz ao conhecimento a descrição de quais as condutas dos agentes públicos são consideradas ímprobas. Mesmo que caminhando a passos largos, é promulgada a Lei nº 12.846/2013, comumente chamada de Lei Anticorrupção, sendo seu objetivo a responsabilização civil dos agentes ativos e passivos.

A adoção do compliance na Administração Pública deriva, entre outros motivos, da ratificação pelo Brasil, através do Decreto n° 4.410/02, da Convenção Interamericana contra a Corrupção, e, mediante o Decreto nº 5.687/06, da Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção, com o fito de promover e fortalecer as medidas preventivas e de combate à corrupção de forma mais eficaz e eficiente (SOUZA et al., 2018, p. 102)

Lei esta que mostrou sua efetividade no curso da Operação Lava Jato, onde exposto no site da Polícia Federal foram analisados valores em operações financeiras investigadas, estimado em mais de R$ 12.500.000.000.000,00 (Doze trilhões e quinhentos milhões de reais).

Quantia esta desviada de cofres públicos é equivalente a quase o dobro do PIB do ano de 2019, que segundo site do IBGE foi de R$ 7.300.000.000.000,00 (sete trilhões e trezentos milhões de reais), dos quais R$ 745.100.000,00 (setecentos e quarenta e cinco milhões e cem mil reais) já foram repatriados. Operação esta que teve como marco o maior número de prisões de agentes públicos e alto escalão do empresariado.

“O Compliance Público aponta para a uma efetivação inovadora ao Brasil como um mecanismo de integridade, calçado em um diagnóstico apurado, com avaliação dos riscos, monitoramentos, auditorias e denúncias que emanem a promoção de uma gestão íntegra e lícita na esperança que possa vir a ser a atitude mais acertada e rápida a retomada política do país, visto o Compliance Público ser um programa de integridade pública”. (Souza, Lima & Lupi, 2018, p. 17)

No embalo dos acontecimentos no combate à corrupção no Brasil, a própria sociedade iniciou um movimento de cobrança de suas autoridades públicas locais e regionais, a adequação de suas legislações e ações efetivas para que pudessem visualizar de perto, tal combate. Daí surgem as leis anticorrupção regionais.

Compliance no Amazonas

Por sua vez, a Lei Estadual nº 4.730/2018 descreve a obrigatoriedade da implantação ou existência de Programa de Integridade para todas as contratações administrativas cujo valor seja igual ou superior aos da concorrência.

“(…) o fato de que o compliance pode acautelar a Administração quanto aos riscos de corrupção, sendo necessária que se irradie também para a esfera privada, em especial, quando tal esfera envolve a Administração Pública, prevenindo, dessa maneira, efetivamente possíveis danos ou tornando menos complexa a apuração de práticas ilícitas (MIKI, 2019, p. 44)

A presente Lei entrou em vigor em 2019, e no mesmo ano já impôs sua obrigatoriedade nas contas do Governo do estado. Como bem exposto pela nota emitida pelo Tribunal de Contas do Estado do Amazonas – TCE/AM, abaixo:

“Além de proteger a administração estadual de atos lesivos, que resultem em prejuízos financeiros causados por irregularidades, desvios de ética e de conduta e fraudes contratuais, a Lei de Compliance prevê multas diárias às empresas contratadas e ainda o impedimento futuro de contratação delas pelo Estado”. (Elvis Chaves, site do TCE/AM )

Nesses moldes, por meio de pesquisa em sites de instituições oficiais do governo federal, foi levantado dados, os quais são de suma importância para o efetivo entendimento de tal disposto em moldes regionais.

Tabela 01: Levantamento de dados de corrupção na área da saúde pública no estado do Amazonas

OPERAÇÃO

CRIMES

ANO

VALOR INVESTIGADO

Maus Caminhos Peculato e de tráfico de influência

2016

R$ 104.859.301,65
Custo Político Corrupção e organização criminosa

2017

110.000.000,00
Eminência Parda Peculato, lavagem de capitais e organização criminosa

2019

R$ 20.000.000,00
Sangria Pertencimento a organização criminosa, corrupção, fraude a licitação e desvio de recursos públicos federais.

2020

R$ 2.000.000,00

Fonte: Site do Ministério Público Federal

Na observância do quadro 01, podemos perceber o quão estruturado se encontra o sistema corrupto na área da saúde do estado do Amazonas. Área a qual deveria ser de preocupação e zelo primários, por se tratar do dinheiro público, atualmente encontra-se a verdadeira válvula de escoamento de dinheiro público. Ao cruzarmos os dados do quadro 01 e do quadro 02, entende-se que os valores desviados impactam de forma significativa na economia pública do Estado.

Tabela 02: Dados das LDO

Lei de Diretrizes Orçamentárias 2020 R$ 2.600.000.000,00
Lei de Diretrizes Orçamentárias 2019 R$ 2.400.000.000,00

Fonte: Site do Governo do Amazonas (SUSAM)

À guisa de ilustração para melhor entendimento para este artigo, buscou-se no site do Tribunal de Contas do Estado do Amazonas , a lista de gestores municipais do estado do Amazonas com suas contas reprovadas e os dados são extremamente alarmantes.

Encontrou-se até a data de 21/10/2020 data da referida pesquisa, 87 unidades gestoras inadimplentes com suas prestação de contas. Nisto, observa-se ainda que grande parte destes, estão em inadimplência com o envio de suas prestações de contas desde 2016.

Assim, resta evidenciado o já descrito por Coelho (2016), onde trouxe à baila a narração do texto da Lei nº 13.303/2016 – Lei das Estatais, onde já menciona a necessidade que nas relações com a administração privada, estes venham observar regras de governança corporativa (Programas de Integridade), assim corroborando no caminho de uma nova estrutura econômica da Administração Pública. Ora regida pela transparência.

A fragilidade das ações da Lei de Integridade em face da Lei do Pregão Eletrônico

Tem-se no que refere-se à conceito de licitação, para Marcelo Alexandrino e Vicente Paulo, licitação é um procedimento administrativo, de observância obrigatória pelas entidades governamentais, em que, observada a igualdade entre os participantes, deve ser selecionada a melhor proposta dentre as apresentadas pelos

Para Maria Sylvia di Pietro (2018), Pregão é a modalidade mais transparente de todas as modalidades de licitação, visto que atende as aquisições independentemente do valor, tendo toda sua trajetória permeada pela transparência dos atos.

O pensamento da autora supracitada, vem a corroborar com a explanação do texto normativo da Lei nº 10.024/219 – Lei do Pregão Eletrônico, in verbis:

Art. 2º O pregão na modalidade eletrônica, também condiciona-se aos princípios constitucionais da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da eficiência, além daqueles pertinentes ao procedimento licitatório, da probidade administrativa, do desenvolvimento sustentável , da vinculação ao instrumento convocatório, do julgamento objetivo, da razoabilidade, da competitividade, da proporcionalidade e aos que lhes são correlatos.. (BRASIL, 2019) (grifos nossos)

Considera-se desta maneira, que conforme descrito no art. 2º da lei em comento, e, considerando ainda a tabela 03, constata-se de plano a eficácia e maior transparência da modalidade de Pregão Eletrônico. Haja vista que e sabido que as etapas das modalidades de licitação, grande parte, possui um nível de sigilo. Dito em sua defesa como forma de blindar o erário público, porém, não permitindo principalmente à sociedade sua fiscalização (SOBRAL 7 NETO, 2020)

Tabela 03: Comparativo entre as Leis nº 8.666/93 e Lei nº 10.024/20

Etapas na contratação com a Administração Pública, sob a ótica da Lei nº 8.666/93

Lei de Licitação

Etapas na contratação com a Administração Pública, sob a ótica do art. 6º da  Lei nº 10.024/2019 – Lei de Pregão Eletrônico

Planejamento da contratação Planejamento da contratação
Publicação de edital de credenciamento e respectivo Regulamento de Chamamento Público Publicação do aviso de edital
Recebimento de inscrições e documentação Apresentação de propostas e de documentos de habilitação
Analise dos documentos Abertura da sessão pública e envio de lances, ou fase competitiva
Habilitação Julgamento
Visita técnica Habilitação
Divulgação dos habilitados Recursal
Parecer da inexigibilidade Adjudicação
Homologação da adjudicação pelo gestor Homologação
Assinatura do contrato

Emissão de ordem de inicio de serviço

Fiscalização

Fonte: Site Planalto

De mesmo modo, ao compararmos as intensidades e abrangências das sanções oriundas de irregularidades nas legislações em comento. Temos mais uma vez, na modalidade de Pregão Eletrônico, além de apresentar-se como modalidade mais transparente, tem-se nela também a maior intensidade de rigor, quanto às situações de irregularidades nas contratações público-privadas. Conforme tabela a seguir.

Tabela 04: Comparativo entre as Leis nº 8.666/93 e Lei nº 10.024/20 referente às sanções impostas.

 

Sanção

Abrangência

Lei nº  8.666/93 Impedimento na realização de novas contratações por até 2 anos. (art 87, III) Somente ao Órgão
Lei nº 10.024/2020 Impedimento na realização de novas contratações por até 5 anos. (art. 49º) Esfera Administrativa (União, Estado e Município)

Fonte: Site Planalto

Faz-se necessário o resgate dos montante das quantias ora auferidas de esquemas corruptíveis como exposto na tabela 01 deste, assim como a maior transparência da modalidade de pregão eletrônico. Na percepção de que a modalidade descrita na Lei nº 10.2024/19 configura melhor ferramenta para o cumprimento da Lei nº 4.730/19.

CONCLUSÃO

Diante todo o supra exposto, podermos de forma plausível constatar que ademais de seus conceitos nobríssimos, a lei de compliance do estado do Amazonas, atualmente configura como mero filtro “cartorário” de documentação, na etapa de execução de contrato. À vista que a atividade da modalidade de licitação “Pregão Eletrônico” configura como método fielmente alinhado às normas de transparência prescritas na Lei Estadual nº 4.730/2019 – Lei de Compliance. Culminando de maior celeridade, eficiência e transparência, o Pregão Eletrônico resta como modelo para futura reforma administrativa já tramitando no Congresso.

REFERÊNCIAS

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http://www.mpf.mp.br/grandes-casos/operacao-maus-caminhos/entenda-o-caso

Artigo escrito por:

Débora Marciel Paiva: Acadêmica de Direito do Centro Universitário Luterano de Manaus. Formanda em 2020. debora-paiva@outlook.com.

João Chaves Boaventura: Professor Orientador. Formação em Ciências Econômicas – Universidade Federal do Amazonas – Direito – ULBRA , Universidade Luterana de Manaus.


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