Afastada prisão preventiva de mulher grávida decretada com fundamentação genérica
21 de fevereiro de 2017O ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF), deferiu liminar no Habeas Corpus (HC) 139889 para revogar a prisão preventiva de uma mulher acusada do crime de tráfico de drogas. O ministro observou que as peculiaridades do caso – o fato de ela estar grávida e ter dois filhos menores – e a fundamentação genérica do decreto de prisão autorizam a revogação da prisão cautelar, destacando que as Nações Unidas, por meio das Regras de Bangkok, recomendam a redução de medidas privativas de liberdade para mulheres infratoras, especialmente as mães, em razão dos cuidados específicos que devem ser dados às crianças.
No caso dos autos, a mulher, que tem 35 anos e já é mãe de uma criança de dois anos e um adolescente de 14 anos, foi presa em flagrante em outubro de 2016. Em seguida, houve a conversão do flagrante em prisão preventiva, sob o argumento de que a acusada teria se envolvido em crime grave.
Após o indeferimento de habeas corpus no Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), a Defensoria Pública estadual pleiteou no STJ a revogação da prisão, com imposição de medidas cautelares, ou sua conversão em prisão domiciliar. Para tal, anexou documentos comprovando a fase adiantada da gravidez e a certidão de nascimento dos filhos menores. O relator no STJ indeferiu o pedido de liminar, motivando a impetração do HC no STF.
Regras de Bangkok
Ao deferir o pedido de liminar, o ministro Lewandowski destacou não ser possível ignorar o fato de a acusada estar grávida e já possuir dois filhos no momento da prisão. Ele salientou que mulheres em situação de prisão têm demandas e necessidades específicas, e que as chamadas Regras de Bangkok propõem que seja priorizada solução judicial que facilite a utilização de alternativas penais ao encarceramento, principalmente quando ainda não houver decisão condenatória transitada em julgado, como se verifica no caso dos autos.
O tratado, segundo o ministro, recomenda que se dê atenção adequada aos procedimentos de ingresso de mulheres e crianças no sistema prisional, devido à sua especial vulnerabilidade nesse momento. Antes ou no momento de seu ingresso, as mulheres responsáveis pela guarda de crianças devem poder tomar as providências necessárias em relação a elas, inclusive com a possibilidade de suspender por um período razoável a medida privativa de liberdade, levando em consideração o melhor interesse das crianças.
Lewandowski assinalou que, apesar de o governo brasileiro ter participado ativamente das negociações para a elaboração das Regras de Bangkok e sua aprovação na Assembleia Geral das Nações Unidas, até o momento elas não foram transformadas em políticas públicas consistentes no país, sinalizando a carência de fomento à implementação e à internalização eficazes pelo Brasil das normas de direito internacional dos direitos humanos. “Cumprir essas regras é um compromisso internacional assumido pelo Brasil”, afirmou. “Embora se reconheça a necessidade de impulsionar a criação de políticas públicas de alternativas à aplicação de penas de prisão às mulheres, é estratégico abordar o problema primeiramente sob o viés da redução do encarceramento feminino provisório”.
O relator também observou que a jurisprudência do STF firmou entendimento de que é flagrantemente ilegal a manutenção da prisão cautelar com fundamento na gravidade abstrata do crime de tráfico de entorpecentes, sem elementos concretos que justifiquem a necessidade de confinamento. A flagrante ilegalidade verificada nos autos, ressaltou Lewandowski, justifica a superação da Súmula 691 do STF. “Dadas as peculiaridades do caso, somadas à constatação da generalidade do decreto prisional e da ausência de suficiente fundamento a justificar a sua manutenção, entendo cabível o deferimento da medida de urgência para revogá-lo”, concluiu.
PR/CR
Processos relacionados
HC 139889
FONTE: STF