Criança terá dupla paternidade em registro
23 de julho de 2021O Tribunal de Justiça de Minas Gerais manteve sentença da Comarca de Belo Horizonte para manter, no registro civil de uma criança, os nomes do pai biológico e do pai socioafetivo. A decisão, por maioria, é da 8ª Câmara Cível.
O pai biológico alega que teve um envolvimento amoroso com a mãe do menino durante sete meses. A mulher ficou grávida; mas, aos seis meses de gestação, o relacionamento acabou. Posteriormente ela se casou com outra pessoa.
Ele diz que evitou contato para não atrapalhar o novo relacionamento, mas recebia notícias por conhecidos comuns. Quando o menino nasceu, em setembro de 2014, procurou a mãe do bebê e soube que ele havia sido registrado em nome do marido dela.
Diante disso, o pai ajuizou ação contra o casal, pedindo o reconhecimento de sua paternidade e a anulação do registro de nascimento do menor.
Em primeira instância, o Ministério Público de Minas Gerais manifestou-se por uma solução intermediária, que fizesse constar do registro o nome do pai biológico e do pai socioafetivo. A sentença julgou o pedido nesse sentido, declarando a paternidade biológica do autor, com a devida inclusão de seu nome no registro, e mantendo a paternidade já registrada.
O pai biológico, inconformado, recorreu, alegando que a paternidade socioafetiva se deu por ato ilícito, de forma criminosa. Para o autor, a atribuição de multiparentalidade seria benéfica apenas se fosse realizada de boa-fé, quando existe harmonia entre os interessados ou na ausência de um dos pais.
A Procuradoria-Geral de Justiça opinou pela negativa da solicitação. O caso suscitou discussão na turma julgadora.
O entendimento majoritário foi proposto pela desembargadora Ângela de Lourdes Rodrigues, que manteve integralmente a sentença, conservando as duas paternidades no documento. Ela foi acompanhada pelos desembargadores Carlos Roberto de Faria e pelo juiz convocado Fábio Torres de Sousa.
A desembargadora Ângela de Lourdes Rodrigues considerou que a ausência de vínculo biológico, por si só, não é motivo para anular a paternidade espontaneamente reconhecida, pois constituiu-se o vínculo afetivo, e “os estreitos e verdadeiros laços familiares se formam pela atenção continuada e pela convivência social”.
De acordo com a magistrada, há provas nos autos de que “o pai registral está inserido de maneira relevantíssima na vida da criança, mesmo sabendo da inexistência de vínculo genético entre eles”.
Nesse caso, impõe-se o registro multiparental, em benefício do menor, porque o menino convive com o pai socioafetivo desde que nasceu, mas a tentativa do pai biológico de ter a paternidade reconhecida data da mesma época.
“Ressalvados entendimentos em sentido contrário, a exclusão da paternidade registral, no presente feito, poderá ocasionar danos irreversíveis ao menor, e a improcedência do pedido de reconhecimento da paternidade em relação ao pai biológico fere seu direito de pai que busca desde os primeiros dias de vida do menor”, concluiu.
Ficou vencido o posicionamento da relatora, desembargadora Teresa Cristina da Cunha Peixoto, que foi acompanhada pelo desembargador Alexandre Santiago. Ela entendeu que inscrever no registro o nome do pai socioafetivo sem consultar o biológico gerou um conflito familiar que ocasiona “efeitos nefastos” na vida e no interesse da criança, “que tem direito de saber a verdade”.
Acesse o acórdão e a movimentação processual.
FONTE: TJMG