CRM deve indenizar mulher que sofreu abuso sexual em consulta médica na adolescência
29 de março de 2023A Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) rejeitou recurso de um Conselho Regional de Medicina (CRM) que buscava afastar a sua responsabilização solidária pelo pagamento da indenização obtida judicialmente por uma mulher que, na adolescência, sofreu abuso sexual cometido por um médico.
Na decisão, o colegiado levou em consideração que o acórdão do tribunal de segundo grau reconheceu a negligência do conselho no acompanhamento do corpo profissional, pois o médico “padecia de moléstias psíquicas gravíssimas” desde a juventude e “não poderia jamais exercer a medicina”, havendo, inclusive, suspeitas de comportamento indevido anteriores ao caso da adolescente.
Segundo a mulher, o abuso ocorreu durante consulta motivada por dor de garganta. Após o crime, ela iniciou tratamento psicológico para lidar com os traumas.
Em primeira instância, o município para o qual o médico trabalhava e o CRM foram condenados a pagar, de forma solidária, R$ 120 mil pelos danos morais e uma indenização por danos materiais em valor a ser apurado. Apesar de manter a condenação de ambos, em segundo grau, o tribunal alterou a divisão proporcional da responsabilidade pela indenização, fixando-a em dois terços para o município – o qual estaria, segundo a corte, mais próximo dos fatos e da conduta do médico transgressor – e um terço para o conselho.
Profissional havia sido expulso de duas residências médicas
Em recurso especial, o CRM alegou que não está entre as suas atribuições exigir atestado de sanidade física e mental para o exercício da medicina, e que eventual providência de sua parte dependeria de haver alguma denúncia por violação do Código de Ética Médica – o que, segundo afirmou, não teria ocorrido no caso.
O ministro Francisco Falcão, relator, apontou que, de acordo com as informações do processo, o médico já havia demonstrado comportamento fora dos padrões profissionais antes de se inserir de forma definitiva na atividade, tendo sido expulso de duas residências médicas.
“Considerando o exposto, e partindo do princípio de que um conselho profissional, entre outros interesses, busca a prevalência de profissionais registrados com condutas éticas, apurando desvios e acompanhando aqueles (inclusive com assistência e orientação) que já se mostram tendentes a possíveis excessos comportamentais, não é possível superar a conclusão a que chegou a corte de origem a respeito da conduta omissiva, do nexo causal e do efetivo dano suportado”, entendeu o ministro.
Segundo ele, para chegar, como pretendia o recorrente, a uma conclusão diversa, seria preciso reexaminar as provas do processo, providência não admitida em recurso especial pela Súmula 7 do STJ.
Francisco Falcão ainda observou que, conforme apontado pelo tribunal de segundo grau, o CRM não juntou aos autos certidão negativa ou outro documento que comprovasse a ausência de registros de reclamação ou denúncia contra o médico, nem informações sobre eventual atuação fiscalizatória, de forma a afastar o entendimento de que a autarquia foi omissa diante das atitudes inadequadas que o profissional já demonstrava.
Em relação ao valor fixado a título de danos morais, Falcão avaliou que o montante pode ser considerado proporcional ao abalo sofrido pela vítima, sendo vedado ao STJ modificar a indenização se ela não se mostrar irrisória ou desproporcional.
O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.
FONTE: STJ