Investigação realizada pela PM não caracteriza usurpação de função pública
5 de julho de 2018Para a juíza Placidina Pires, da 10ª Vara Criminal de Goiânia, a Polícia Militar pode sim realizar funções investigativas, em casos excepcionais. “Ao realizar atividade investigativa, inclusive aquela implementada por seus integrantes do serviço reservado (P2), embora essa não seja sua função típica, a Polícia Militar não vulnera nenhuma determinação constitucional ou infraconstitucional, mormente quando o inquérito policial é conduzido pela Polícia Civil, presidida pelo Delegado de Polícia”, afirmou.
Com esse entendimento, ela condenou Alefy Nathan Pereira de Souza a 1 ano e 8 meses de reclusão, por tráfico de drogas, refutando a alegação da defesa de que houve usurpação de função pública. A pena, fixada em 5 anos, foi reduzida em dois terços, devido ao réu ser primário, de bons antecedentes, não se dedicando às atividades criminosas nem integrando organização criminosa e, por não exceder 4 anos, foi substituída por duas restritivas de direito, consistindo na prestação de serviços comunitários, à razão de uma hora de tarefa por dia de condenação, e prestação pecuniária na doação de um salário mínimo. Ele também foi condenado ao pagamento de 176 dias-multa, no valor mínimo legal.
De acordo com a denúncia, Amanda Heloísa Guimarães Pedro e Alefy Nathan Pereira de Souza tinham em depósito, em sua residência, cerca de 50 gramas de cocaína e 16 munições de arma de fogo, sem autorização. As investigações apuraram que os acusados mantinham uma espécia de boca de fumo, armazenando ali drogas e guardando bens e valores obtidos com as vendas.
Após a Polícia Militar receber notícia anônima de que no endereço eram comercializadas drogas, uma equipe se dirigiu até o local, onde foram autorizados a entrar para realizar buscas. Durante o procedimento, foram encontradas as munições, pacotes de cocaína, mais de R$ 2 mil e produtos recebidos em troca das drogas.
A defesa técnica requereu a declaração de nulidade do feito, argumentando que houve usurpação de função pública, em razão de os policiais do serviço de inteligência terem participado da prisão dos acusados. Sustentou que houve violação de domicílio, aduzindo que os policiais adentraram à residência dos imputados sem autorização judicial e sem que houvesse fundadas razões de que estivesse ocorrendo crime em seu interior.
O Ministério Público do Estado de Goiás (MPGO) requereu a condenação de Alefy nas sanções dos artigos 33 da Lei nº 11.343/2006 e 12 da Lei nº 10826/2003 – tráfico de drogas e possuir munição de uso permitido, em desacordo com determinação legal ou regulamentar. Quanto à Amanda, requereu sua absolvição em relação a todas as imputações feitas.
4-PlacidinaUsurpação de função pública
Placidina Pires verificou que, apesar da alegação de que os policiais invadiram a casa em que os acusados moravam, todos os agentes estatais ouvidos em juízo relataram, de forma uníssona, que foram autorizados a adentrar o imóvel, não existindo indícios de que os policiais tivessem a intenção de prejudicar injustamente os imputados. Ressaltou que, se não tivesse havido o consentimento para entrarem, as provas obtidas seriam ilícitas.
Informou que as investigações indicavam que haviam drogas no interior da residência e outros objetos relacionados ao tráfico de drogas, o que autorizava a entrada dos agentes públicos no imóvel. “Verifico, portanto, que a entrada dos policiais na residência dos imputados se encontrava legitimada porque, de acordo com a prova produzida, após receberem a notícia de que no endereço descrito na denúncia ocorria a comercialização de substâncias entorpecentes, os policiais do serviço de inteligência iniciaram o monitoramento, constatando uma grande movimentação de pessoas no local, as quais se tratavam de usuários de drogas”, afirmou.
Quanto ao argumento de que houve usurpação de função pública, a magistrada explicou que o artigo 144 da Constituição Federal prevê que a segurança pública é direito e responsabilidade de todos e um dever para o Estado. O parágrafo 4º do mesmo artigo confere às policias civil e federal a exclusividade de exercício das funções de polícia judiciária, não devendo confundi-la com funções de polícia investigativa, responsáveis pela colheita de elementos acerca da autoria e materialidade das infrações penais.
“Nesse vértice, infere-se que a atividade de polícia investigativa pode ser exercida por outras autoridades administrativas, além das policias civil e federal, não havendo, portanto, nenhum obstáculo, nulidade ou usurpação de poder nas investigações realizadas pela Polícia Militar”, disse a juíza, complementando que a realização dessa atividade pela polícia militar, inclusive por P2, “não vulnera nenhuma determinação constitucional ou infraconstitucional e nem retira da Polícia Militar o seu caráter de polícia ostensiva e de preservação da ordem pública”.
Por fim, explicou que a Polícia Militar só não pode realizar atividades próprias de polícia judiciária, como instaurar inquérito policial para apurar infrações penais, exceto as militares, ofertar representações perante o Poder Judiciário para realização de busca e apreensão, interceptações telefônicas, quebra de sigilo, decretação de prisão, etc. Portanto, concluiu que não houve nenhum vício na ação da polícia. Veja a sentença. (Texto: Gustavo Paiva – Centro de Comunicação Social do TJGO)
FONTE: TJGO