Processos relacionados a cotas imobiliárias chegam ao Poder Judiciário
28 de setembro de 2017As chamadas cotas imobiliárias, propriedades fracionadas ou regime de multipropriedade, modelo de negócio que é muito utilizado na Europa e Estados Unidos, vêm ganhando força no Brasil. Esta modalidade permite que pessoas que não teriam condições de adquirir um apartamento, por exemplo, consigam comprar o imóvel e dividir os custos com outros interessados. Devido à explosão desse conceito, ações relacionadas a esse tipo de venda começaram a chegar ao Judiciário.
Muitas delas estão em Caldas Novas, que fica a 165 quilômetros de Goiânia, na Região Sul do Estado, e é conhecida por ser a maior estância hidrotermal do mundo, com águas que brotam do chão em temperaturas que variam de 43° a 70°. A cidade tem como principal fonte de renda o turismo e, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), no município há cerca de 80 mil habitantes, porém, em alta temporada, chega a comportar mais de 500 mil turistas.
De acordo com a juíza Fabíola Fernanda Feitosa de Medeiros Pitangui, do Juizado Especial Cível e Criminal da comarca, os processos relacionadas à multipropriedade começaram a chegar no ano passado. No entanto, segundo ela, foi a partir do início deste ano que o número de processos aumentou consideravelmente. Um levantamento feito pela magistrada identificou, de junho até agora, 65 ações somente nesta unidade judiciária.
“Os casos também são novos para a gente. Porém, a grande quantidade de ações vem nos preocupando e a tendência é que este número aumente cada vez mais”, destacou Fabíola. De acordo com a juíza, estes processos ainda estão sem desfecho, mas ela adiantou que as pessoas relatam que há um marketing agressivo e muitas afirmam que não há tempo de pensar, nem de ler o contrato.
Uma pessoa que não quis se identificar afirmou que recebeu o convite de um vendedor e que fizeram uma “lavagem cerebral” nele. “Passei o dia todo lá. Cheguei de manhã e saí só no final da tarde. Eles me mostraram vídeos e não me deixaram ir embora. Acabei comprando uma cota e dando uma quantia alta de entrada”, relatou. Como não conseguiu cancelar a compra, o homem garante que vai entrar com uma ação na Justiça.
O presidente da Subseção de Caldas Novas da OAB-GO, Andrei Aparecido Ribeiro de Souza Barbosa, também se diz preocupado com a alta demanda que chegará à Justiça em razão desta modalidade de negócio. “O Poder Judiciário local já possui um grande número de processos em razão da particularidade da comarca, que em épocas de alta no turismo recebe milhares de pessoas. É preciso estar preparado estruturalmente para receber estes novos casos”, salientou.
Cuidados
A equipe do Centro de Comunicação Social do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás teve acesso a um contrato particular de compra e venda de unidade imobiliária de um empreendimento na cidade no regime de cotas imobiliárias. O documento tem 8 cláusulas e mais de 20 páginas. Consta ainda o preço total da venda, forma de pagamento, índice de reajuste e forma de aplicação, sobre inadimplência e etc.
Ao assinar o contrato, o comprador declara que tem entendimento sobre o índice a ser aplicado para reajuste anual das parcelas referidas; que leu e está de acordo com as características e especificações, tanto da parte concernente às informações gerais, quanto da unidade autônoma que está sendo adquirida; que recebe e aceita esse contrato e seus anexos sem todos os seus expressos termos; entre outras.
Cancelamento
Uma pessoa que não quis se identificar contou que, atualmente em Caldas Novas, há em torno de 50 mil cotas sendo comercializadas e cerca de seis grupos que trabalham com esse tipo de conceito. Segundo a fonte, a questão das cotas imobiliárias tem uma característica que é a chamada venda de impacto e, segundo ele, para esse tipo de negócio há em média um índice de cancelamento que gira em torno de 30%. A prática vem sendo adotada no município há mais ou menos cinco anos, mas nos últimos três anos, houve intensificação das vendas. “Há grupos que a partir de agora só vão lançar esse conceito, que é mais rentável”, frisou, ao exemplificar que uma unidade imobiliária que custa em torno de R$ 100 mil, eles conseguem vender por mais do dobro do valor.
A chamada venda de impacto tem atraído compradores. Os anúncios comerciais chamam os possíveis clientes. “O interessado pode adquirir uma ou mais cotas imobiliárias conforme sua disponibilidade de tempo para desfrutar de momentos únicos com a família e seus amigos” ou “outra grande vantagem é que quando não se utiliza algum dos períodos que compõem a cota imobiliária adquirida, o proprietário poderá destiná-lo para locação transformando-se assim em um retorno financeiro para o orçamento familiar”, dizem os anúncios. (Texto: Arianne Lopes / Fotos: Aline Caetano – Centro de Comunicação Social do TJGO)
FONTE: TJGO