STJ – Rejeitado recurso de auditores da Receita que assessoravam empresas em processos fiscais
18 de agosto de 2014A Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou provimento ao recurso de dois auditores fiscais da Secretaria da Receita Federal que se associaram em uma empresa de consultoria e assessoramento na área tributária. Acusados de fazer fortuna com uma prática ilegal, foram condenados com base na Lei 8.429/92 (Lei de Improbidade Administrativa).
Com a decisão da Turma, os servidores ficam obrigados a restituir os valores recebidos de maneira indevida e terão seus direitos políticos suspensos por oito anos, o que impossibilita o exercício de cargos públicos no período. Um deles, licenciado, perde o cargo de auditor fiscal.
Paulo Baltazar Carneiro, servidor aposentado, e Sandro Martins Silva, licenciado para tratar de interesses particulares, eram sócios na Martins Carneiro Consultoria Empresarial Ltda. Eles prestavam consultoria tributária e exerciam a defesa de grandes empresas em processos administrativos em trâmite na Receita Federal.
De acordo com o processo, os auditores ocupavam cargos na cúpula da Receita e, em razão disso, conseguiam clientes dispostos a pagar altas quantias pelos seus serviços.
Revezamento
A estratégia de negócio adotada pelos sócios e firmada em contrato funcionava da seguinte forma: quanto menos as empresas assessoradas pagassem ao fisco, mais os donos da consultoria receberiam dessas empresas.
Essa atividade foi exercida no período de 1994 a 2002 e possibilitou a acentuada evolução patrimonial de ambos, fato comprovado nos autos e confirmado pelos sócios.
Segundo a sentença condenatória, os sócios se revezavam no exercício da função pública, quer como auditor fiscal, quer como ocupante de cargo em comissão na Receita, mesmo após formarem considerável fortuna com a assessoria tributária. Enquanto um dos sócios atuava na empresa, o outro trabalhava na Receita.
A sentença foi confirmada pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), que reconheceu que a aposentadoria descaracteriza o vínculo jurídico estabelecido entre a administração e o servidor público, particularmente no que se refere ao regime disciplinar estabelecido na Lei 8.112/90. Entretanto, o TRF1 afirmou que o servidor licenciado se submete a todos os deveres e proibições previstos no estatuto, pois a licença não interrompe o vínculo com a administração. E o servidor aposentado deveria ser enquadrado pela Lei de Improbidade.
Dever de lealdade
No STJ, a defesa dos servidores alegou que as proibições e deveres previstos na Lei 8.112 somente alcançavam os servidores públicos em exercício.
Entretanto, para o relator do recurso, ministro Humberto Martins, não há como concluir que seja permitido ao auditor fiscal prestar serviços de consultoria e assessoramento a empresas para que elas paguem menos, deixem de pagar tributos ou se favoreçam de alguma forma com os conhecimentos técnicos inerentes ao exercício do cargo, mesmo que o servidor esteja de licença para tratar de assuntos particulares.
O ministro afirmou que a Lei 8.112, em seu artigo 116, estabelece que o servidor tem o dever de ser leal à instituição em que trabalha e de manter conduta compatível com a moralidade administrativa. No artigo 117, proíbe o servidor de se valer do cargo para lograr proveito pessoal ou de outrem, em detrimento da dignidade da função pública, e de exercer quaisquer atividades que sejam incompatíveis com o exercício do cargo ou função e com o horário de trabalho.
Vínculo preservado
Humberto Martins acrescentou que os sócios também não poderiam ignorar os princípios constitucionais da legalidade, da impessoalidade e da moralidade.
O ministro destacou que é pacífico no âmbito dos tribunais superiores o entendimento de que a licença não descaracteriza o vínculo jurídico do servidor com a administração, conforme afirmou a ministra Ellen Gracie, relatora do Recurso Extraordinário 382.389, no Supremo Tribunal Federal.
Segundo o ministro, a licença possui caráter temporário, podendo o servidor assumir o cargo a qualquer tempo, “não estando livre para agir de maneira contrária aos interesses públicos”. Por isso, está sujeito às disposições legais que se aplicam ao cargo, entre elas a Lei 8.112.
Parceria
A Turma entendeu ainda que ambos deveriam sofrer as sanções da Lei de Improbidade, pois o sócio aposentado agiu em parceria com servidor da ativa, beneficiando-se de sua conduta ilícita, já que partilhava dos lucros obtidos.
Humberto Martins rebateu a tese da defesa dizendo que a expressão “durante a atividade” não se confunde com “durante o exercício do cargo”. De maneira contrária ao que afirmam os recorrentes, “durante a atividade” diz respeito ao servidor que não se encontra aposentado, ou seja, na inatividade – explicou o relator.
O ministro destacou ainda que todas as conclusões a que chegou o TRF1 sobre os fatos ocorridos são resultado da análise das provas dos autos, “o que não é passível de revisão em recurso especial, conforme entendimento da súmula 7 do STJ”.
Esta notícia se refere ao processo: REsp 1352448
FONTE: STJ