TRT anula justa causa por não considerar comprovada a autoria de adulteração em atestado médico
24 de setembro de 2021Uma auxiliar de serviços gerais conseguiu reverter a despedida por justa causa aplicada com base na alegação de que teria fraudado um atestado médico. Para a 11ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-RS), a prova produzida no processo não assegura que as rasuras no documento foram realizadas pela trabalhadora acusada de falsificação. A decisão do colegiado manteve a sentença proferida pela juíza Marcele Cruz Lanot Antoniazzi, da 1ª Vara do Trabalho de Bagé.
Na petição inicial, a auxiliar narra que faltou ao serviço no dia 4 de outubro de 2018, uma quinta-feira. Nessa data, foi atendida pelo médico do sindicato, que lhe forneceu atestado para afastamento unicamente no dia 4. A autora faltou ao trabalho também no dia 5.
Na segunda-feira (8), a trabalhadora apresentou à empregadora o atestado referente ao dia 4. O documento foi recebido por uma enfermeira. Segundo a autora, nele constava autorização para afastamento do trabalho por um dia. O atestado foi encaminhado para o analista de recursos humanos da empresa, que constatou que os dias de falta haviam sido alterados de um para dois. Esse empregado prestou depoimento no processo, a convite da empresa.
Ao analisar o caso em primeiro grau, a juíza Marcele considerou que a perícia grafodocumentoscópica não foi capaz de identificar quem efetuou a adulteração nos dias de afastamento. A prova oral igualmente não foi convincente, no seu entendimento. O analista de recursos humanos declarou que não se recordava exatamente de quantos dias era o atestado que recebeu, “mas acredita que era de 1 dia”. Ele afirmou ainda que “em relação à reclamante tinha uma rasura no atestado em relação à quantidade de dias, não lembra se era 1 ou dois dias”. Por fim, a magistrada ressaltou que a enfermeira que recebeu o documento sequer foi convidada a servir de testemunha pela reclamada.
“Assim, negada pela autora a autoria de adulteração no atestado médico entregue à reclamada, e dado o teor da prova oral e grafodocumentoscópica, sendo atribuição da reclamada evidenciar a justa causa para a ruptura do contrato, que não se reconhece, não há como validar a penalidade, impondo-se a reversão da justa causa para a dispensa imotivada”, fundamentou a sentença.
Em consequência, a reclamada foi condenada a pagar à autora as parcelas devidas na rescisão sem justa causa: aviso-prévio proporcional, décimo terceiro salário proporcional e multa de 40% sobre o FGTS. A empresa também deverá entregar à trabalhadora as guias para encaminhamento do seguro-desemprego. A juíza ainda considerou ser devido o pagamento de uma indenização pela injusta acusação de fraude. O ressarcimento pelos danos morais sofridos foi fixado na sentença em R$ 10 mil.
A empresa recorreu ao TRT-RS. A relatora do caso na 11ª Turma, desembargadora Vania Mattos, destacou que a justa causa é a penalidade máxima aplicada ao empregado. Por essa razão, o grave motivo alegado para a rescisão contratual deve ser suficientemente comprovado pela empregadora. No caso do processo, a julgadora afirmou não poder concluir, a partir da prova oral, que a empregada apresentou o atestado já rasurado, para constar dois dias de afastamento. Além disso, assinalou que a perícia realizada no documento também se mostrou inconclusiva quanto à autoria das alterações. Por fim, na linha da sentença, a relatora apontou que a enfermeira, que poderia contribuir para o esclarecimento dos fatos, nem mesmo foi convidada pela empresa para ser ouvida como testemunha.
“O fato de a autora ter de justificar duas faltas (dias 4 e 5 de outubro de 2018) e ter recebido atestado de apenas um dia de afastamento do trabalho não autoriza a conclusão que a empregada não dispunha de outra alternativa que não fosse a de falsificar o documento, notadamente porque a análise dos cartões ponto juntados (…) demonstra a existência de inúmeras ausências abonadas”, destacou Vania. Na mesma linha, a magistrada observou que durante o contrato de trabalho a autora teve diversos afastamentos por motivo de doença, com apresentação de atestados médicos, “sem que se tenha notícia de qualquer irregularidade na conduta da trabalhadora, que não recebeu qualquer tipo de penalidade durante a relação de emprego – fato este incontroverso”.
Nesse contexto, a Turma considerou não ter sido comprovada a prática de ato de improbidade pela trabalhadora e declarou nula a justa causa aplicada. Os desembargadores mantiveram a condenação da empresa em pagar à autora uma indenização por danos morais, decorrente da imputação à trabalhadora da prática de um ato ilícito passível de responsabilização criminal. No entanto, entenderam adequado reduzir o valor da reparação de R$ 10 mil para R$ 3 mil.
A decisão foi unânime no colegiado. Também participaram do julgamento o desembargador Rosiul de Freitas Azambuja e a desembargadora Flávia Lorena Pacheco. Cabe recurso do acórdão ao Tribunal Superior do Trabalho (TST).
FONTE: TRT4