TRT reconhece assédio moral contra gerente que era xingada por dono de loja
30 de maio de 2023A 6ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (RS) julgou que houve assédio moral no caso de uma gerente que era xingada pelo dono da loja na frente de colegas e clientes. A decisão determinou a rescisão indireta do contrato de trabalho ¿¿— situação na qual, em razão da falta grave do empregador, o trabalhador tem direito a receber as parcelas que seriam devidas em uma despedida sem justa causa.
A relatora do acórdão, desembargadora Beatriz Renck, adotou a perspectiva interseccional de gênero ao julgar o caso e foi acompanhada pelos demais desembargadores, Fernando Luiz de Moura Cassal e Simone Maria Nunes. A decisão, da qual ainda cabe recurso, reformou a sentença do juízo da 9ª Vara do Trabalho de Porto Alegre.
A trabalhadora foi admitida em uma loja de assistência em tecnologia como vendedora e, posteriormente, passou à gerência. Conforme mais de uma testemunha, os episódios de gritos e xingamentos aconteceram após sua promoção, em uma loja de um shopping de Porto Alegre. Expressões como “cala a boca” e “ignorante” teriam sido dirigidas à empregada mais de uma vez.
Inicialmente, a desembargadora Beatriz Renck destacou que a questão exigia o julgamento “com as lentes da perspectiva interseccional de gênero”, considerando-se o fato de a autora da ação ser mulher. Para a magistrada, os julgamentos que ocorrem nos diversos ramos do Judiciário devem servir para concretizar um papel de não repetição de estereótipos, de não perpetuação de diferenças, constituindo-se em um espaço de rompimento com culturas de discriminação e de preconceitos.
A partir dos relatos, a desembargadora concluiu que o tratamento desrespeitoso dispensado pelo proprietário do empreendimento à trabalhadora, em especial diante de clientes e colegas, configurou falta grave do empregador. “Entendo comprovado o alegado assédio moral ensejador da ruptura contratual por justa causa do empregador, na medida em que não se pode exigir do trabalhador que permaneça trabalhando diante destas condições. Entendo, pois, configurada a hipótese prevista no art. 483, b, da CLT”, destacou a magistrada.
O Protocolo de Julgamento com Perspectiva de Gênero, adotado pela relatora Beatriz, foi editado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em outubro de 2021. A utilização do Protocolo nos julgamentos foi objeto da Recomendação nº 128/2022 do CNJ e, mais recentemente, da Resolução 492, de março deste ano, que orientam magistradas e magistrados na apreciação das diversas questões.
Igualdade – “Alcançar a igualdade de gênero e empoderar todas as mulheres e meninas” é o Objetivo de Desenvolvimento Sustentável de nº 5, da Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas. O princípio também encontra resguardo nos ODS de nº 10 (Redução das desigualdades: reduzir as desigualdades dentro dos países e entre eles) e nº 16 (Paz, justiça e instituições eficazes: promover sociedades pacíficas e inclusivas para o desenvolvimento sustentável, proporcionar o acesso à justiça para todos e construir instituições eficazes, responsáveis e inclusivas em todos os níveis). Supremo Tribunal Federal (STF) e CNJ se comprometeram com a pauta proposta pela ONU.
Na Constituição Federal, o direito está garantido nos artigos 3º (incisos I, III e IV) e 5º (inciso I). O Brasil ainda assumiu compromissos internacionais: Convenção sobre a Eliminação de todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres (Cedaw), em 01/02/1984, e as Convenções da Organização Internacional do Trabalho (100 – Igualdade de Remuneração de Homens e Mulheres Trabalhadores por Trabalho de Igual Valor, 103 – Relativa ao amparo à maternidade, 111 – Discriminação em Matéria de Emprego e Ocupação).
Com o mesmo objetivo de assegurar a igualdade, a Convenção nº 190, sobre a Eliminação da Violência e Assédio no Mundo do Trabalho, ainda não foi ratificada pelo país.
FONTE: TRT4