Boletim Jurídico – Publicações Online

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Código de Defesa do Consumidor / Notícias

Uso do Crediscore para análise de crédito dos consumidores abre projeto Debates Polêmicos do TJRS

Violação de direitos ou simples ferramenta de análise de risco para concessão de crédito? Com essa indagação inicial, o Crediscore, serviço baseado em um conjunto de indicadores com diferentes variáveis que indica a probabilidade de inadimplência dos clientes, oferecido pela Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL) aos varejistas, foi o tema que abriu o projeto Debates sobre Temas Polêmicos, promovido pelo Centro de Estudos do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS). O evento, restrito a magistrados, servidores e estagiários, acabou ganhando a participação extra de advogados, interessados no assunto, e ocorreu nessa terça-feira (20/8) fazendo lotar o Plenário Ministro Pedro Soares Muñoz, no prédio do Tribunal, em Porto Alegre, nessa terça-feira (20/8).

O Coordenador do Centro de Estudos do TJRS, Desembargador Eugênio Facchini Neto, abriu os debates, explicando que o tema divide a opinião dos magistrados. Ele ressaltou existirem duas Ações Coletivas tramitando no Judiciário Estadual, que questionam o uso do Crediscore. Uma, foi considerada procedente e a outra, não. Sem falar nas ações individuais, às milhares. A divisão está marcada no seio da magistratura, afirmou o Desembargador.

Afronta ao Código de Defesa do Consumidor

O Juiz Gilberto Schäfer, que integra o chamado G-8, grupo de magistrados que julga ações de massa, revelou que, diariamente, ingressam no Judiciário Estadual 600 processos questionando o uso do Crediscore. Ele esclareceu que a posição do grupo é pela ilegalidade do banco de dados. Sabemos de histórias de consumidores que tiveram seu crédito negado e não sabem o motivo. O banco de dados é formado por dados de ações revisionais e informações prescritas, afirmou o Juiz. Outra questão que envolve o tema diz respeito ao dano moral. O valor das indenizações tem sido pacificado pelo G-8 em
R$ 1.500,00. Temos estabelecido uma quantia que não é muito alta, mas que não estimule o serviço. O grupo opta também por, nesses casos, não exigir que o autor apresente a prova do dano moral.

O Desembargador Tasso Caubi Soares Delabary, que atua na 9ª Câmara Cível do TJRS, considera que o Crediscore afronta o artigo 43 do Código de Defesa do Consumidor (CDC), que trata do acesso do consumidor às informações existentes em cadastros, fichas, registros, dados pessoais e de consumo arquivados sobre ele, bem como sobre as suas respectivas fontes. Existe uma discussão quanto à natureza do Crediscore: é um banco de dados? É um cadastro? É uma ferramenta? Talvez seja uma forma de mascarar a atividade para fugir das obrigações apontadas pelo CDC, afirmou o magistrado.

Ele acredita que falte objetividade ao sistema, que tem o dever de transparência, mas não esclarece quanto às informações exatas que nele constam. Esse banco de dados nasceu numa situação de sacralidade: ele envolve o nome do cidadão, mas é tratado apenas entre o lojista e a empresa, sob alegação de que cláusulas contratuais impedem a sua divulgação, afirmou. O crédito é uma opção do lojista. Mas o que se trata, nesses casos, é a atividade desenvolvida pela CDL que contraria o CDC, asseverou o magistrado, que questionou também o limite temporal dos dados inclusos no sistema. Então, que se abra o banco de dados e se demonstre como as informações são classificadas e avaliadas. Nem a CDL nem nenhuma outra entidade ligada à análise de crédito fizeram isso até agora, questionou o Desembargador Tasso.

O Desembargador Túlio de Oliveira Martins, da 10ª Câmara Cível do TJRS, também considera que a iniciativa fere o CDC e também o Código Civil. Destacou o quanto são valiosas as informações sobre os consumidores, usando como exemplo o recente convênio firmado entre o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e a Serasa, que permitiu o repasse de dados de eleitores brasileiros à empresa. O crédito não deixa de ser um elemento da base monetária; é uma moeda virtual. Estatisticamente, os dados de um indivíduo são inexpressivos. Mas de um grupo têm muito valor.

O magistrado ainda destacou a transparência das informações, cada vez mais uma exigência da sociedade. As informações são tão públicas quanto possível. O Estado brasileiro segue nesse caminho, seja pela legislação, seja por decisões judiciais. E isso deve avançar também nas relações de consumo, concluiu o Desembargador Túlio.

Demandismo

O Desembargador Ney Wiedemann Neto defendeu a legalidade do serviço oferecido pela CDL. Ele disse que tanto a 6ª Câmara Cível quanto o 3° Grupo Cível do TJRS, onde atua, se posicionam dessa forma. Mas que tudo pode mudar assim que o Superior Tribunal de Justiça decidir quanto ao encaminhamento de ações repetitivas. A 5ª e a 6ª Câmaras Cíveis estão divididas. O rumo é imprevisível. Hoje, não existe um incidente de jurisprudência que daria aos juízes uma pacificação sobre a matéria. Estamos aguardando o entendimento do STJ, afirmou o magistrado.

Na avaliação do Desembargador, o Crediscore é um serviço de consulta oferecido ao lojista que, ao consultar o sistema, obtém um índice que aponta a capacidade de endividamento do cliente. A relação contratual que se estabelece é com o lojista. É ele quem vai decidir, ressaltou. O magistrado disse ainda que vê com preocupação o demandismo das ações contra o banco de dados. Muitos autores não tiveram o crédito negado, mas receberam o convite para ingressar com as ações, muitas vezes, sem compreender o que se passa, mediante promessa de receber uma indenização, explicou. Em razão disso, muitos juízes passaram a fazer audiências de conciliação. E eu já recebi agravos onde os autores alegam que não gostariam de participar das conciliações, completou o Desembargador Wiedemann.

O Advogado da CDL Porto Alegre, Fernando Fabris, fez alguns esclarecimentos sobre o Crediscore. Disse que é oferecido aos lojistas desde 2006, que não se utiliza de dados de ações revisionais, nem de informações anteriores há cinco anos. Afirmou também que, desde 2010, quando foi concedida liminar em favor da ação ajuizada pela Associação Gaúcha de Defensores dos Interesses da Cidadania e do Consumidor (AGDICC), questionando o serviço, a entidade presta informações aos consumidores interessados em saber a respeito dos seus dados. Mas que, desde então, a procura tem sido baixa.

Fabris ressaltou ainda que os dados que integram o sistema trazem referências impessoais. Ele não está centrado nas informações pessoais do consumidor, não teria como saber tanto sobre a vida de cada um. Por exemplo, ele pode cruzar a idade do cliente com dados econômicos do IBGE sobre a faixa etária em que o mesmo se enquadra. Ou seja, são conclusões avaliativas de crédito.
O advogado da CDL também destacou o aumento do ingresso de ações de danos morais contra a entidade. Segundo ele, no ano passado, eram 204 processos e, até junho de 2013, já chegam a 4,9 mil. A falta de necessidade de constituir a prova e o valor das indenizações facilitam o ajuizamento das ações. A simples existência do serviço já o condena.

Sobre o convênio entre o TSE e a Serasa, disse que a iniciativa era apenas para saber o endereço dos clientes e se esses estão vivos. O convênio gerou tanta polêmica, acerca do sigilo das informações dos cidadãos, que acabou sendo suspenso pelo Tribunal Superior Eleitoral.

FONTE: TJRS


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