Vítima de assédio sexual em trem urbano será indenizada em R$ 20 mil pela transportadora
17 de maio de 2018A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) deu provimento ao recurso de uma mulher assediada sexualmente dentro de um trem na cidade de São Paulo e condenou a Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) a pagar indenização de R$ 20 mil por danos morais.
A mulher sofreu assédio em um vagão de trem na estação de Guaianazes, quando retornava do trabalho para casa. A primeira e a segunda instância julgaram improcedente o pedido de indenização formulado contra a CPTM, por entenderem que a agressão praticada por terceiros é fato fortuito que afasta a responsabilidade objetiva da empresa, inexistindo a obrigação de reparar o dano.
Para a relatora, tal situação merece um olhar atento do Poder Judiciário. “O momento é de reflexão, pois não se pode deixar de ouvir o grito por socorro das mulheres, vítimas costumeiras dessa prática odiosa, que poderá no futuro ser compartilhado pelos homens, também objetos potenciais da prática de assédio”, argumentou a ministra ao afirmar que a responsabilidade objetiva da empresa não pode ser afastada em tais circunstâncias.
Risco da atividade
Segundo Nancy Andrighi, é evidente que, ao ser exposta a assédio sexual, a passageira teve sua incolumidade física e psíquica violada. A incolumidade, na visão da relatora, é ínsita ao contrato de transporte, sendo dever da transportadora levar o passageiro com conforto e segurança ao seu destino.
“Mais que um simples cenário ou ocasião, o transporte público tem concorrido para a causa dos eventos de assédio sexual. Em tal contexto, a ocorrência desses fatos acaba sendo arrastada para o bojo da prestação do serviço de transporte público, tornando-se assim mais um risco da atividade, à qual todos os passageiros, mas especialmente as mulheres, tornam-se sujeitos”, disse ela.
A magistrada afirmou que a responsabilidade do transportador pode ser afastada quando a conduta praticada por terceiro não guarda relação com a organização do negócio e os riscos da atividade de transporte, equiparando-se a fortuito externo. Por outro lado, caracteriza-se fortuito interno quando o fato é conexo à atividade econômica e aos riscos inerentes à sua exploração.
De acordo com a ministra, a ocorrência de assédio sexual guarda conexidade com os serviços prestados pela CPTM, caracterizando fortuito interno, e, dessa forma, a transportadora permanece objetivamente responsável por reparar o dano.
Sexismo
Segundo a relatora, atos de caráter sexual alheios à vontade da pessoa a quem se dirigem revelam manifestação de poder do homem sobre a mulher, mediante a objetificação de seus corpos. “É inegável que a vítima do assédio sexual sofre um evidente abalo em sua incolumidade físico-psíquica, cujos danos devem ser reparados pela prestadora do serviço de transporte de passageiros”, afirmou.
Nancy Andrighi declarou que os casos de assédio sexual e violação da liberdade sexual das mulheres são um problema cultural no país.
“Em uma sociedade nitidamente patriarcal como a brasileira, a transição da mulher da esfera privada – isto é, doméstica – para a esfera pública – espaço de atuação do homem – revela e dá visibilidade à histórica desigualdade de gênero existente nas relações sociais” – o que justifica a atuação do Poder Judiciário para coibir abusos.
Leia o voto da relatora.
Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):
REsp 1662551
FONTE: STJ