Aplicação de súmula que proíbe cumprimento de pena em regime mais severo é tema de ações no STF
12 de setembro de 2016Aprovada em junho deste ano, a Súmula Vinculante (SV) 56, que veda o cumprimento de pena em regime mais gravoso a que o sentenciado tem direito, está se tornando um instrumento para assegurar garantias individuais dos condenados e, em consequência, melhorar as condições no sistema prisional. Desde sua entrada em vigor, o Supremo Tribunal Federal (STF) tem recebido diversos processos, da classe processual Reclamação, contra decisões que mantiveram pessoas presas em regime mais severo que o estabelecido em sentença ou autorizado por lei.
A reclamação é o instrumento utilizado para preservar ou garantir a autoridade das decisões do STF perante os demais tribunais. O descumprimento de súmula vinculante é um desses casos passíveis de análise por meio de reclamação.
O objetivo da SV 56, proposta pela Defensoria Pública da União (DPU), é assegurar que a execução da pena não se dê em regime mais severo do que o fixado em sentença por causa da deficiência estatal em prover vagas no regime a que o réu foi sentenciado. Segundo a DPU, a intenção é evitar o convívio de pessoas que praticaram ilícitos de menor gravidade com outras condenadas por crimes mais graves.
A SV 56 estabelece que devem ser seguidos os critérios fixados no Recurso Extraordinário (RE) 641320, com repercussão geral. Segundo a tese, havendo déficit de vagas, deverá ser determinada a saída antecipada de sentenciado no regime com falta de vagas, a liberdade eletronicamente monitorada ao sentenciado que saia antecipadamente ou que é posto em prisão domiciliar por falta de vagas e o cumprimento de penas restritivas de direito e/ou estudo ao sentenciado que progrida ao regime aberto. Ainda de acordo com a súmula, até que sejam estruturadas as medidas alternativas propostas, poderá ser deferida a prisão domiciliar ao sentenciado.
Na Reclamação (RCL) 24840, por exemplo, o ministro Luís Roberto Barroso deferiu liminar para garantir prisão domiciliar a um apenado que, embora tivesse direito à progressão para o regime semiaberto, foi mantido em regime fechado. A decisão refere-se a um professor de Joinville (SC) obteve o direito de cumprir pena no regime semiaberto, mas não pôde fazê-lo porque a cidade não dispõe de colônia agrícola, industrial ou estabelecimento similar, nem de casa de albergado para cumprir a reprimenda em regime aberto.
O juízo da 3ª Vara Criminal de Joinville permitiu o cumprimento do restante da pena em prisão domiciliar, com trabalho externo e frequência a curso de graduação, entretanto, o Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJ-SC) determinou a volta do condenado ao regime fechado, por entender que não havia ilegalidade no cumprimento da prisão em regime mais gravoso quando mantidos os benefícios do trabalho externo e estudo – decisão questionada no STF.
O decano do STF, ministro Celso de Mello, por sua vez, concedeu liminar na RCL 24951 para garantir a um condenado, também beneficiado por progressão de regime mas que não pode fazê-lo por falta de vaga, o direito de aguardar em prisão domiciliar o surgimento de vaga em estabelecimento adequado ao cumprimento da pena em regime semiaberto. O ministro entendeu que a situação configura excesso de execução, circunstância vedada pelo artigo 185 da Lei de Execução Penal (LEP), e traduz frontal transgressão ao comando contido na SV 56/STF. O ministro Celso de Mello ressaltou que este fato resulta de conduta inteiramente imputável ao Estado, que deixa de adotar as medidas necessárias para implementar um dever básico estabelecido na própria LEP.
Audiências de custódia
Lançado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em fevereiro de 2015, o projeto Audiência de Custódia obriga a apresentação dos presos em flagrante a um juiz no prazo de 24 horas após a prisão. O presidente do STF e do CNJ, ministro Ricardo Lewandowski ressalta que o projeto ataca a cultura de encarceramento e punição ao possibilitar que um magistrado analise a prisão sob o aspecto da legalidade e também verifique e coíba eventuais ocorrências de tortura ou de maus-tratos, entre outras irregularidades
O projeto prevê também a estruturação de centrais de alternativas penais, centrais de monitoramento eletrônico, centrais de serviços e assistência social e câmaras de mediação penal, que serão responsáveis por representar ao juiz opções ao encarceramento provisório. Dados do Conselho Nacional de Justiça apontam que o projeto já produz resultados concretos na mudança da cultura por representantes do Estado.
O ministro Lewandowski salienta que um dos principais objetivos do projeto é evitar a longa permanência na prisão de pessoas sem condenação. Ele destaca que, em muitos casos, presos provisórios (ainda não julgados) ficam sujeitos a violência, abusos e ainda podem ser arregimentados pelas facções criminosas que, de dentro dos presídios, comandam atos criminosos contra a população. Observa, ainda, que a implementação das audiências de custódia está prevista em pactos e tratados internacionais assinados pelo Brasil, como o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos e a Convenção Interamericana de Direitos Humanos, conhecida como Pacto de San Jose.
“Estado de coisas inconstitucional”
Em setembro de 2015, o tribunal deferiu parcialmente pedido de liminar na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 347, de relatoria do ministro Marco Aurélio, reconhecendo o estado de coisas inconstitucional do sistema penitenciário. Na ocasião, os ministros determinaram aos juízes e tribunais que passem a realizar audiências de custódia, no prazo máximo de 90 dias a partir da data de julgamento (9 de setembro de 2015), de modo a viabilizar o comparecimento do preso perante a autoridade judiciária em até 24 horas contadas do momento da prisão.
PR/EH
FONTE: STF