Convenção de Montreal é aplicável a contrato de transporte aéreo mesmo após descarregamento
21 de maio de 2018As regras previstas pela Convenção de Montreal são aplicáveis aos casos de transporte aéreo internacional de cargas enquanto os bens permanecerem sob custódia da transportadora, o que pode ocorrer mesmo após o descarregamento em aeroporto brasileiro.
Nessas situações, estando a carga sob responsabilidade da transportadora, não se aplicam as normas do Código Civil, e também não se aplicam os dispositivos do Código de Defesa do Consumidor (CDC) para embasar pretensões indenizatórias relacionadas a ilícito contratual praticado pela transportadora durante as formalidades aduaneiras.
Com base nesses entendimentos, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) afirmou que as regras de direito internacional previstas na Convenção de Montreal prevalecem em relação às de direito interno, e por isso deu provimento a um recurso da UPS do Brasil Remessas Expressas para julgar improcedente a ação de indenização proposta por uma cliente devido a atrasos na liberação da carga transportada dos Estados Unidos para o Brasil.
A carga chegou ao país em dezembro de 2007, e a demanda foi proposta em março de 2010, fora do prazo de dois anos previsto na Convenção de Montreal para ajuizamento da ação.
Os ministros reconheceram a prescrição bienal, nos termos da convenção. O tribunal de origem, apesar de afastar a aplicação do CDC, havia permitido o prosseguimento da demanda por entender que a relação coberta pela convenção tinha sido encerrada com o descarregamento da carga, o que levaria à aplicação das regras de prescrição do Código Civil.
Bens sob custódia
Segundo o ministro relator do recurso especial, Paulo de Tarso Sanseverino, ao contrário do que entendeu o tribunal de origem, o vínculo jurídico do contrato de transporte internacional de cargas perdura “enquanto a carga permanecer sob custódia da transportadora”, o que pode ocorrer mesmo após a saída dos bens do avião.
“Não basta o simples descarregamento da aeronave para se encerrar o contrato de transporte, sendo necessário, ainda, que a carga seja recebida por quem de direito no aeroporto, para só então sair da custódia da transportadora, encerrando a execução do contrato de transporte”, disse.
Na visão do relator, é inviável a conclusão do tribunal de origem, de aplicar o prazo prescricional trienal do Código Civil, possibilitando o prosseguimento da demanda. A empresa cliente alegou que uma classificação equivocada feita pela UPS do Brasil acarretou custos adicionais de armazenamento enquanto os bens aguardavam o despacho aduaneiro, gerando direito à indenização.
STF
No voto acompanhado pela unanimidade do colegiado, Sanseverino observou que, ao contrário do CDC, a Convenção de Montreal prevê a responsabilidade subjetiva da transportadora em casos análogos.
De acordo com o ministro, a incidência da legislação de consumo ao caso poderia conduzir a uma responsabilidade objetiva do transportador, “resultado manifestamente não desejado” pelos países signatários da convenção internacional, o que reforça a necessidade de sua aplicação em vez das normas de direito interno.
O relator destacou que o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, em repercussão geral, que as Convenções de Montreal e Varsóvia prevalecem ante o CDC nos casos em que consumidores buscam indenização por danos materiais decorrentes de extravio de bagagem em voos internacionais (Tema 210/STF).
Sanseverino lembrou que a prevalência da norma internacional em relação às de direito interno encontra amparo no artigo 178 da Constituição Federal, e a decisão do STF demonstra preocupação com o descumprimento de acordos internacionais no setor aéreo.
Leia o acórdão.
Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):
REsp 1615981
FONTE: STJ