IRDR sobre repartição de receitas do IRRF proposto pelo TRF4 é estendido a todo o país pelo STF
7 de fevereiro de 2018A presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Cármen Lúcia, determinou que sejam suspensas, em todo o território nacional, as decisões de mérito que envolvam a interpretação do artigo 158, inciso I, da Constituição Federal, em processos individuais ou coletivos que discutem a distribuição das receitas arrecadas a título de Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF), incidente sobre rendimentos pagos, a qualquer título, pelos municípios a pessoas físicas ou jurídicas contratadas para prestação de bens ou serviços.
A decisão foi tomada em Petição (Pet) 7001, na qual a ministra concedeu abrangência nacional aos efeitos suspensivos da decisão proferida pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), que alçou ao rito de Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR) – previsto no novo Código de Processo Civil – a matéria discutida na ação em que o Município de Sapiranga (RS) pede que lhe seja destinado o IRRF pago a terceiros pelo fornecimento de bens e serviços.
No caso que serviu de paradigma, o juiz da 1ª Vara Federal de Novo Hamburgo (RS) concedeu liminar para suspender a exigibilidade, relativamente à União, do IRRF incidente sobre pagamentos efetuados pelo município a pessoas que não se enquadrem como servidores e empregados públicos. De acordo com atos normativos da Coordenação Geral de Tributação (Cosit) e da Receita Federal do Brasil, estados e municípios somente podem se apropriar do IRRF pago a servidores e empregados públicos, de modo que, nas demais hipóteses, o IRRF deve ser informado na Declaração de Débitos e Créditos Tributários Federais (DCTF) e recolhido à União.
Segundo a ministra Cármen Lúcia, como bem enfatizado pela Procuradoria-Geral da República, a concessão de abrangência nacional aos efeitos suspensivos da decisão proferida pelo TRF4, considerando-se a existência de outras ações envolvendo repartição de receitas tributárias decorrentes do recolhimento de IRRF e o notório interesse das demais unidades da Federação na resolução da controvérsia, é medida que evita soluções conflitantes e permite que, não apenas o TRF4 decida a questão de modo uniforme, mas o próprio STF fixe, em abstrato, a melhor interpretação para as normas constitucionais em análise.
A decisão da ministra Cármen Lúcia suspende apenas os atos decisórios de mérito, mantendo a possibilidade jurídica de adoção dos atos e das providências necessárias à instrução das causas instauradas ou que vierem a ser ajuizadas e do julgamento dos eventuais pedidos distintos e cumulativos deduzidos. Ela determinou que a petição apresentada pela União seja reatuada como Suspensão Nacional do Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (SIRDR), nos termos da Resolução-STF 604, de 11 de dezembro de 2017. Está será a SIRDR de número 1 a tramitar no Supremo Tribunal Federal.
Pedido da União
No STF, a União sustentou que, caso o TRF4 adote uma interpretação contrária aos atos regulamentares expedidos pela administração tributária, o País teria 1.159 municípios – os 467 do Rio Grande do Sul, os 399 do Paraná e os 293 de Santa Catarina somados – a recolher a exação de uma forma, enquanto outras 4.411 cidades repassariam o IRRF de outra forma. Por isso, apontou a urgência em se conferir segurança jurídica ao tema, pois a interpretação do artigo 158, inciso I, da Constituição Federal atingiria os 26 Estados e o Distrito Federal. Lembrou que existem ações semelhantes em tramitação nos TRFs da 1ª e 5ª Regiões.
A União ressaltou que tramita no Supremo uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5565, de relatoria do ministro Luiz Fux, em que o governador do Distrito Federal questiona instrução normativa da Receita Federal sobre o tema, bem como normas da Coordenação Geral de Tributação (Cosit). Ocorre que o ministro Fux não conheceu da ADI, por questionar provimentos executivos ligados diretamente a atos normativos de natureza primária (Código Tributário Nacional e demais leis disciplinadoras do IRRF).
Por sua vez, a ministra Cármen Lúcia verificou a inexistência de recurso extraordinário com repercussão geral reconhecida, ou representativo da controvérsia, no qual se discuta a mesma questão jurídica posta no Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR) admitido no TRF4. Segundo a ministra, nem o eventual julgamento de uma das ações ajuizadas no Supremo nas quais se discute a distribuição das receitas arrecadadas a título de IR, incidente sobre valores pagos pelos estados e DF (ACOs 2866, 2970, 2930, 2854 e 2.897) afastaria a situação de insegurança jurídica dos municípios, pois seus efeitos ficariam restritos às partes, já que Ações Cíveis Originárias não têm efeito vinculante.
Em sua decisão, a ministra Cármen Lúcia acolheu o argumento da União de que há elementos a justificar a suspensão nacional de decisões de mérito a respeito do tema, em razão do efeito multiplicador dos processos envolvendo a repartição de receitas tributária entre a União e os demais entes federados, estando suficientemente demonstrada a atualidade da controvérsia com risco de ofensa à isonomia. Segundo informações da PGFN, há divergência de entendimento na esfera administrativa entre a própria PGFN e o Tribunal de Contas da União, sem contar a judicialização da controvérsia no STF e na Justiça Federal de Minas Gerais e Pernambuco.
Segundo a ministra, a prestação jurisdicional uniforme somente virá, nesse contexto, pela fixação de tese abstrata formada em precedente dotado de efeito vinculante, a partir do julgamento do recurso extraordinário interposto do IRDR, ou, ainda, da viabilidade na utilização do instrumento previsto no artigo 947 do Código de Processo Civil, que dispõe sobre o incidente de assunção de competência. Ela citou trecho do parecer da PGR segundo qual “[a suspensão nacional] é medida que evita soluções conflitantes e permite que, não apenas a corte regional decida a questão de modo uniforme, mas o próprio Supremo Tribunal Federal fixe, em abstrato, a melhor interpretação para as normas constitucionais em análise”
Inovação do CPC
O Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR) foi inserido no Direito brasileiro pelo Código de Processo Civil (CPC) de 2015 como medida de eficiência da gestão de processos pelo Poder Judiciário, inspirado na experiência estrangeira de institutos processuais de uniformização da prestação jurisdicional pela coletivização de demandas individuais.
O instrumento processual compõe o denominado “microssistema de solução de casos repetitivos”, cuja eficácia está fundada na observância do assentado no caso-modelo, pelo que se tem afirmado a valorização do precedente com o advento do CPC de 2015, aproximando nosso sistema jurídico, de tradição romano-germânica (civil law), do common law (anglo-saxônico), com o propósito de fomentar a segurança jurídica e a igualdade de tratamento entre os jurisdicionados.
O sobrestamento dos “processos pendentes, individuais ou coletivos, que tramitam no Estado ou na região” onde admitido o SIRDR e a possibilidade de estender-se esse sobrestamento ao território nacional favorecem a racionalidade e a eficiência processuais, contribuindo, assim, para distribuição equânime da jurisdição sobre idêntica controvérsia posta em ações judiciais diversas.
A mesma precaução pode ser adotada no processo de decisão dos recursos especial (ao STJ) e extraordinário (ao STF) repetitivos, no qual se incluem as sistemáticas da repercussão geral e dos recursos representativos da controvérsia, competindo ao relator determinar a suspensão nacional dos processos com a mesma questão de direito. A viabilidade dessa medida preventiva nos recursos repetitivos aperfeiçoou a organicidade do novo sistema processual brasileiro, considerada a missão constitucional dos tribunais superiores de uniformizar a interpretação sobre a legislação nacional.
Fonte: Imprensa STF
IRDR 50088354420174040000/TRF