Proteção do consumidor não o exclui dos efeitos da recuperação judicial
27 de março de 2017A proteção do consumidor como direito fundamental não é capaz de blindá-lo dos efeitos do processo de recuperação judicial do fornecedor.
Com esse entendimento, os ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reconheceram que viola o juízo atrativo da recuperação a ordem de penhora on-line decretada por julgador diverso daquele que preside o processo de reestruturação financeira de sociedade empresária fornecedora.
Na origem, ao solucionar conflito de competência entre a Comarca de Niterói e a 7ª Vara Empresarial da Comarca da Capital, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) entendeu que as regras de proteção ao consumidor justificavam a prática de atos constritivos pelo juízo de Niterói, responsável pelo processamento de ação indenizatória ajuizada por consumidor, mesmo após o deferimento da recuperação judicial da fornecedora pelo titular da vara empresarial.
Definição expressa
Para o relator do recurso no STJ, ministro Villas Bôas Cueva, a Lei de Falência e Recuperação (Lei 11.101/05) dispõe de forma clara a respeito de quais créditos não se sujeitam à recuperação judicial.
O magistrado lembrou que, apesar da natureza exemplificativa do rol de direitos básicos do consumidor previsto no CDC (artigo 7º), a Lei de Falências e Recuperação Judicial, sistema normativo especial e posterior, optou por perpetuar a omissão do diploma consumerista, não complementando a lista de garantias destinadas aos consumidores com excepcionalidades voltadas ao processo de recuperação.
Hipertrofia da preservação da empresa
Destacou-se, no voto, que o espírito da LFR (interpretação teleológica), em especial a máxima efetividade dos dispositivos informadores da recuperação, revela que a ausência de privilégios aos consumidores não representa falha legislativa, mas opção premeditada e proposital destinada à hipertrofia da preservação da empresa.
“Admitir a criação de um privilégio não contemplado em lei, e, por consequência, não calculado pelos organizadores do plano, seria, por via oblíqua, dificultar a árdua tarefa de impedir a extinção das sociedades empresárias que enfrentam dificuldades financeiras e se socorrem na recuperação judicial, desprezando o regramento da LFR e a realização de todos os direitos e objetivos a ela agregados”, afirmou o ministro.
Por essa razão, segundo o relator, deve prevalecer, no caso, a jurisprudência do STJ firmada no sentido de que todos os atos de constrição de crédito em desfavor da empresa recuperanda devem ser decididos pelo juízo responsável pela recuperação.
Medida mais adequada
O ministro explicou que esse juízo é o único “capaz de promover a classificação e satisfação dos créditos sem privilegiar ou prejudicar determinada classe ou frustrar a reorganização financeira da empresa”.
Acompanhado por unanimidade pelos demais ministros, Villas Bôas Cueva concluiu que as regras de proteção ao consumidor não são absolutas, devendo prevalecer a competência do juízo da recuperação judicial para, após o seu deferimento, decidir sobre todas as medidas de constrição e venda de bens integrantes do patrimônio da recuperanda, haja vista ser a medida mais adequada para a preservação da empresa e, por consequência, a satisfação dos múltiplos interesses a ela vinculados.
Leia o acórdão.
Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): REsp 1598130
FONTE: STJ