STJ – Flanelinha se livra de prisão por exercício irregular da profissão
21 de junho de 2013A Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) extinguiu ação penal contra um guardador de carros do Rio Grande do Sul, que exercia a profissão irregularmente. Os ministros consideraram que a falta de registro no órgão competente não constitui justa causa para a propositura da ação.
O exercício da profissão de guardador e lavador autônomo de veículos é regulado pela Lei 6.242/75, que dispõe que tais ocupações, em todo o território nacional, dependem de registro na Delegacia Regional do Trabalho.
Ao exercer a atividade em via pública da cidade, o flanelinha foi denunciado pelo Ministério Público estadual por exercício ilegal da profissão. Na denúncia, o MP considerou que o cuidador de veículos infringiu o artigo 47 da Lei de Contravenções Penais (Lei 3.688/41), que prevê prisão simples ou multa para esses casos.
Prova negativa
De acordo com a denúncia, o flanelinha cuidava de veículos estacionados em via pública e recebia dinheiro pela atividade. No primeiro grau, o juiz rejeitou a denúncia, pois entendeu que não ficou comprovada a falta de registro no órgão competente e, por isso, não havia justa causa para a ação penal.
Inconformado com a decisão, o MP apelou para o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS), que modificou a decisão. Para a corte, estavam descritos todos os elementos para o recebimento da inicial acusatória.
De acordo com o segundo grau, não poderia ser exigido do MP que fizesse prova negativa. Para o TJRS, não cabe à acusação comprovar que o denunciado não estava inscrito no órgão específico, pois essa prova caberia à defesa e não ao órgão acusatório.
Os desembargadores destacaram que o flanelinha possui cinco condenações pelos crimes de furto, roubo e porte de droga, e é reincidente.
Ônus da acusação
No STJ, a Quinta Turma reformou a posição do TJRS e confirmou o entendimento do primeiro grau. Para o ministro Marco Aurélio Bellizze, relator do habeas corpus, incide sobre o órgão de acusação “o ônus de demonstrar, ainda que minimamente, porém com fundamento de relativa consistência, os fatos constitutivos sobre os quais se assenta a pretensão punitiva”.
Os ministros explicaram que a Lei de Contravenções Penais teve a intenção de “garantir que determinadas profissões – que exigem conhecimento especial ou habilitação específica – sejam exercidas por profissionais habilitados, coibindo, desse modo, o abuso e a dissimulação em desfavor daqueles que acreditam estar diante de profissionais aptos”.
Perturbação mínima
Para o relator, a falta de registro no órgão competente configurou “perturbação social de ordem mínima, que não justifica a intervenção do direito penal, podendo ser resolvida, sem dificuldades, no âmbito administrativo”. Basta que o acusado providencie a inscrição na Delegacia Regional do Trabalho.
Bellizze esclareceu que a restrição de direitos do indivíduo apenas se justifica “quando estritamente necessária à proteção da sociedade e de outros bens jurídicos que lhes sejam essenciais”.
A Turma não descartou que os guardadores ou lavadores de veículos possam ser responsabilizados no âmbito criminal. Segundo os ministros, isso pode acontecer se, “a pretexto de exercer a profissão, o agente exigir do motorista, mediante violência ou ameaça explícita ou implícita, o pagamento para estacionar em via pública, demonstrando-se, ainda, que o valor cobrado não se refere à vigilância, mas ao preço para não ter o bem danificado”.
Tal conduta, de acordo com os ministros, poderia ser incluída nos tipos penais relativos à extorsão, constrangimento ilegal e outros. Porém, o caso denunciado é de exercício de profissão sem inscrição no órgão específico.
Para o colegiado, a denúncia não veio acompanhada de elementos mínimos capazes de atrair a incidência do tipo penal. Por isso, a Quinta Turma extinguiu a ação contra o guardador de carros, em virtude da “patente falta de justa causa”.
Processos: HC 190186
FONTE: STJ