TJSC reconhece relação de consumo em financiamento bancário contratado por MEI
23 de setembro de 2024A 2ª Câmara de Direito Comercial do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) reconheceu que o financiamento contratado por um microempreendedor individual (MEI), mesmo sendo firmado entre uma instituição bancária e uma pessoa jurídica, pode ser caracterizado como uma relação de consumo, estando, portanto, sujeito às normas do Código de Defesa do Consumidor (CDC).
Esse entendimento foi adotado ao julgar o recurso de um MEI que solicitou a anulação de uma ação de busca e apreensão movida por um banco. A instituição financeira havia iniciado a ação contra o microempreendedor por inadimplência em um financiamento para aquisição de um veículo Ford Ka ano 2010. A sentença inicial determinou a apreensão do automóvel.
O juízo de primeira instância, na Unidade Estadual de Direito Bancário, decidiu que, conforme jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ), o CDC não se aplicaria aos financiamentos bancários contratados por pessoas jurídicas com o objetivo de desenvolver suas atividades empresariais, uma vez que não configuraria uma relação de consumo.
Contudo, o microempreendedor recorreu alegando que a constituição em mora era irregular e defendendo que havia uma relação de consumo entre as partes. Ele também reivindicou a revisão de cláusulas abusivas, apontou a cobrança indevida de tarifas e a prática de venda casada em relação ao seguro prestamista, além de alegar violação ao princípio da boa-fé objetiva.
Ao analisar o recurso, o desembargador relator do caso destacou que a aquisição do veículo, no contexto apresentado, visava o uso final como consumidor, evidenciando a vulnerabilidade econômica do apelante. Segundo o relator, “o reconhecimento de um microempreendedor individual, que exerce a profissão de tatuador — ainda pouco valorizada apesar de sua relevância —, como consumidor frente a uma das maiores instituições bancárias do país, ao adquirir um veículo usado, é uma forma de concretizar os direitos fundamentais previstos na Constituição Federal e de fortalecer o caráter igualitário dos direitos humanos.”
Com o reconhecimento da relação de consumo, o relator passou a analisar os demais pontos do recurso. Ele enfatizou que, com base no artigo 2º do CDC, a inversão do ônus da prova, prevista no artigo 6º da mesma legislação, deveria ser aplicada.
Assim, decidiu-se que a relação de consumo entre as partes deveria ser reconhecida, e a sentença inicial foi desconstituída. O processo retornará à instância de origem para nova avaliação, especialmente no que diz respeito à distribuição do ônus da prova e a eventual instrução, com um novo julgamento a ser realizado. O voto do relator foi acompanhado pelos demais membros da 2ª Câmara de Direito Comercial do TJSC (Apelação n. 5084856-20.2022.8.24.0930).
FONTE: TJSC