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Direito Tributário / Notícias

O Estatuto das Cidades: Análise do IPTU progressivo como instrumento de politica urbana nos municípios

RESUMO: Os municípios são, após o advento da Constituição Federal de 1988, entes federativos dotados de capacidades de governo e administração próprios de modo que cooperam juntamente com os demais entes federados para melhor atender as necessidades da população. Para tal, contam com o Estatuto das Cidades para a implementação de diretrizes gerais e especificas da política urbana com o intuito de satisfazer a lacuna constitucional deixado pelo legislador. Através do Plano Diretor, o município possui o dever imposto pelo texto constitucional, deve-se fazer uso dos instrumentos ofertados pela política urbana, um deles é o IPTU progressivo pelo tempo, o qual tem como uma das funções garantir recursos que visam aperfeiçoar o que estar disponível, cumprindo o seu papel social, de modo que sejam garantidas as necessidades sociais do espaço urbano. Portanto, este estudo possui como objetivo geral analisar, juridicamente, como o IPTU progressivo se torna um instrumento de política urbana municipal.

PALAVRAS-CHAVE: Município; Direito; IPTU; Política; Propriedade.

ABSTRACT: After the advent of the 1988 Federal Constitution, municipalities are federal entities endowed with their own government and administration capacities so that they cooperate together with other federal entities to better meet the needs of the population. To this end, they rely on the Statute of Cities for the implementation of general and specific urban policy guidelines in order to satisfy the constitutional gap left by the legislator. Through the Master Plan, the municipality has the duty imposed by the constitutional text, it is necessary to make use of the instruments offered by urban policy, one of which is the progressive IPTU over time, which has as one of its functions to guarantee resources that aim to improve what be available, fulfilling its social role, so that the social needs of the urban space are guaranteed. Therefore, this study aims to analyze, legally, how the progressive IPTU becomes an instrument of municipal urban policy.

KEY-WORDS: County; Right; IPTU; Policy; Property.

INTRODUÇÃO

A promulgação da Constituição Federal em 1988 é um marco para a história brasileira, pois de forma explícita o texto constitucional tocou em temas antes esquecidos pelas Constituições que a antecederam. A questão urbanística foi um dos assuntos menos tocados, de modo que princípios hoje garantidos por lei como o desenvolvimento econômico e social não eram colocados em prática ou se quer existiam.

Com as constantes mudanças da sociedade, a política urbana se tornou um grande campo de estudos pelo Direito haja vista que com o passar dos anos, grandes números de pessoas passaram a viver em grandes centros urbanos, como as metrópoles. Decorrente dessa elevada concentração da população nesse tipo de ambiente resultou em uma necessidade de se estabelecer regras de conduta, de modo que o espaço físico exigiu uma limitação de ações e regras que consigam organizar e evitar conflitos nesse espaço, agora ocupado.

O espaço agora ocupado, o qual passou a ser chamado de Município se tornou um ente federativo o qual foi conferido várias atribuições como autonomia e capacidade de governos e administração. Diante disso, o ente federativo chamado de Município passou a ser objeto de estudo para auferir quais atributos foram lhes conferidos nesse novo processo de democratização de direitos e deveres que atingiram os entes federados.

Mas, indo além do desenvolvimento da autonomia dos Municípios, estes se tornaram agentes de uma política urbanística que é imposta pela Constituição Cidadã. Diante disse, para melhor se concretizar os ideais constitucionais, surge o Estatuto das Cidades com diretrizes e normas gerais de desenvolvimento sustentável do meio ambiente artificial, ou seja, de obrigações que o Poder Público Municipal deve ter com relação as cidades. Para tanto, os municípios usam de instrumentos ofertados pela Política de Desenvolvimento Urbano inseridos nas atribuições municipais.

Desta forma, esse estudo tem como objetivo principal analisar o uso do Imposto Predial e Territorial Urbano progressivo como instrumento de desenvolvimento da Política Urbana. Além de estudar as generalidades do imposto municipal e apresentar o Estatuto das Cidades como meio jurídico de efetivação dos direitos fundamentais, sociais e coletivos para a aplicação do desenvolvimento sustentável utilizando ferramentas financeiras e administrativas que ficam sob a guarda do Município como ente da República Federativa do Brasil.

1. O ESTATUTO DAS CIDADES, OS INTRUMENTOS DA POLITÍCA URBANA E O MUNICÍPIO NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988

Para compreendermos os limites e estipulações que abrangem o Município na Constituição Federal de 1988, se faz necessário conceituar o que venha a ser o Município. Hely Lopes de Meirelles (2008, pág. 128), conceitua o município em três esferas: Sociológico, Legal e Político. No quesito sociológico, o município se trata de um agrupamento de pessoas em um mesmo território, mas que estes detenham interesse comum e se reúnam em estrutura de uma sociedade para que haja uma satisfação de necessidades individuais e com o desempenho em atribuições coletivas. Flávia Bahia (2020, pág. 418) explica o que seria o Município:

“De acordo com a Constituição de 1988, os Município são pessoas jurídicas de direito público, possuem auto-organização, que lhes permite a elaboração de sua própria Lei Orgânica (manifestação legislativa, por meio do poder constituído atribuído à Câmara Municipal); possui governo identificado pelo Executivo e Legislativo (art. 29) – entretanto não dispõe de um Judiciário próprio, sendo os litígios dos quais faz parte levados a julgamento perante os Tribunais Estaduais – e também têm o seu quadro de servidores e serviços que devem respeitar aos artigos 37 a 41 da CF/88.” (BAHIA, pág. 418, 2020)

No quesito legal, o município se trata de uma pessoa jurídica de direito público interno, com capacidade civil de exercer direitos e adquirir obrigações responder pelas ações de seus agentes, conforme conta no artigo 37, §6º da Constituição e artigo 41, inciso III do Código Civil. Por fim, o autor supracitado conceitua o Município, no quesito político, como a entidade estatal que na ordem federativa ocupa o terceiro lugar, além de estar ligada ao estado a qual pertence conforme linhas gerais da própria Constituição Federal.

A Constituição Federal de 1988 é a constituição que inaugurou o regime democrático de direito e permitiram que assuntos antes não abordados fossem, de alguma forma, assistidos pela maior lei de uma nação. Todos estão sujeitos a sua estrutura e as palavras nela contida, de modo que na hierarquia das leis do nosso ordenamento jurídico pátrio, a Constituição Cidadã está na mais alta posição.

Criada em um cenário novo, a Constituição Federal de 1988 conferiu autonomia e poderes aos municípios, os quais agora possuem o status de ente federado e compõe a República Federativa do Brasil. O Município passou a ser dotado de poderes administrativos, financeiros e políticos com capacidade de exercício de governo e administração, conforme o artigo 18 da Constituição Federal. Assim, são dotados de características próprias como o autogoverno, a autoadministração e autonomia sendo apenas subordinado, em alguns casos, ao Estado a qual pertence, mas, todavia, desligado deste nos demais casos.

Para exercer essa nova roupagem conferida pela Constituição Federal e melhor atender as demandas sociais que surgem no cotidiano de um Município, foi-se criado o Estatuto das Cidades através da Lei 10.257, sancionada no dia 10 de julho de 2001, com o objetivo de criar uma política urbana que abranja as necessidades urbanas de administração e direito urbanístico, conforme consta nos artigos 182 e 183 da Constituição Federal.

Os artigos supracitados relatam que cabe ao Município, através do seu Plano Diretor devidamente aprovado pela Câmara Municipal, o desenvolvimento da política pública urbana para que se alcance a satisfação dos anseios que a população que compõe o município necessita. Diante dessa ideia, o Estatuto da Cidade veio como uma lei que reforce a necessidade de um papel mais efetivo do poder público municipal para executar a política de desenvolvimento urbano municipal e, até o plano nacional.

Esta lei federal possui o papel de desenvolver, conforme exige o texto constitucional, as funções sociais da cidade, dando o devido cuidado ao que tange a propriedade, buscando executar as construções necessárias respeitando o conceito de sustentabilidade; atentando-se ao direito de moradia, o saneamento ambiental, transporte público e as vias de estradas, serviços públicos municipais, trabalho, lazer e a gestão pautada na democracia e na participação popular.

A Lei 10.257/2001, também chamada de Estatuto das Cidades, precisamente em seu artigo 2º estipula os objetivos que devem ser alcançados pelo Poder Público Municipal estipulando as diretrizes gerais da política urbana que consta na Constituição Federal de 1988. Essas diretrizes garantem a cooperação entre os governos, a iniciativa privada e demais setores da sociedade para que os interesses sociais sejam atendidos no processo de urbanização. Além disso, garante a regularização fundiária para os municípios entre outros direitos que constam no rol desse artigo.

Mas para que se aplique a política urbana pelo poder municipal, é necessário que este faça uso dos instrumentos que a própria política oferece. Conforme o Estatuto das Cidades, os principais instrumentos da política urbana são: a gestão democrática, o plano diretor, o imposto predial territorial urbano progressivo no tempo, desapropriação com pagamento de títulos da dívida pública, o usucapião especial, o direito de superfície, direito de preempção e o estudo de impacto de vizinhança.

Esses instrumentos estão elencados no artigo 4º da Lei 10.257/2001 cujo rol não é taxativo, mas sim exemplificativo abrangendo a possibilidade de existir outros tipos de instrumentos, o que é previsto nas linhas do próprio artigo. Podemos dividir esses instrumentos em instrumentos gerais e específicos. Os primeiros são aqueles que possuem a utilidade para todas as cidades, por outro lado os instrumentos específicos atendem particularmente apenas algumas cidades. Exemplificando a diferença entre esses dois, o primeiro são todos aqueles elencados no artigo 4º do Estatuto das Cidades, enquanto o segundo pode ser todos aqueles que o governo das próprias cidades fazem uso.

É importante ressaltar que esses instrumentos também de subdividem em duas finalidades: originária e derivada. A finalidade originária pode ser conceituada como todo o esforço para que se efetuem as diretrizes gerais; já a finalidade derivada são as que originam a concretização da maior finalidade. Assim, mais uma vez a efetivação e desenvolvimento da política urbana possuem um caráter social e jurídico, respeitando os direitos dos cidadãos que residem no território do município.

Também podemos citar como um dos métodos de execução da política urbana é o planejamento municipal, o qual é possível a utilização dos instrumentos como o plano diretor, a disciplina do parcelamento, do uso e da ocupação do solo, além do devida gestão orçamentária participativa e do respeito às diretrizes orçamentárias e orçamento anual. Por outro lado, para a efetiva utilização dos institutos tributários e financeiros a própria lei coloca a dispor os seguintes instrumentos: o IPTU, contribuição de melhoria, incentivos e benefícios fiscais e financeiros.

Para utilização dos dispositivos jurídicos e políticos, a lei em comento dispõe dos seguintes instrumentos: desapropriação, servidão administrativa, limitações administrativas, tombamento de imóveis ou de mobiliário urbano, instituições de unidades de conservação, instituição de zonas especiais de interesse social, concessão de direito real de uso, concessão de uso especial para fins de moradia, parcelamento, edificação ou utilização compulsórios, usucapião especial de imóvel urbano, direito de superfície, direito de preempção, outorga onerosa do direito de construir e de alteração de uso, transferência do direito de construir, operações urbanas consorciadas, regularização fundiária, assistência técnica e jurídica gratuita para as comunidades e grupos sociais menos favorecidos, referendo popular e plebiscito, demarcação urbanística para fins de regularização fundiária, legitimação de posse.

Francisco e Goldfinger (2017, pág. 45) nos permitem compreender como os instrumentos utilizados para fins de regular o uso da propriedade, visando o bem coletivo, pode ser regidos por uma legislação própria e como afeta a sociedade servindo de base para atender os anseios da comunidade. Vejamos:

“Nas hipóteses de programas e projetos habitacionais de interesse social, desenvolvendo por órgãos ou entidades Administração Pública com atuação especifica nessa área, a concessão de direito real de uso de imóvel públicos poderá ser contratada coletivamente. Os instrumentos que demandem dispêndio de recursos por parte do Poder Público Municipal devem ser objeto de controle social garantido a participação de comunidades, movimentos e entidades da sociedade civil (art. 4º, §3º, do Estatuto das Cidades)
A expressão controle social funda-se na possibilidade da admissão de segmentos da sociedade que exerçam uma função controladora em apoio ao Poder Público. O objeto de controle social são os atos e as atividades em que incidem a função controladora, enquanto a finalidade do controle social recai sobre preservação da ordem urbanística e no modo por que são executados os instrumentos legislativos e administrativos ligados à política urbana e desenvolvimento pela sociedade.” (FRANCISCO E GOLDFINGER, pág. 45,2017)

Assim, o município possui a árdua tarefa de organizar e aplicar as diretrizes gerais para efetiva aplicação dos princípios e direitos na política urbana, sempre visando à melhor aplicação dos recursos públicos que venham satisfazer as necessidades da população daquele município. É importante ressalvar que o atendimento aos princípios da administração geral, esculpidos no art. 37 da Constituição, é uma forma de preservação do principio da dignidade humana, o qual passa obrigatoriamente prevalecer à gestão democrática da cidade, pois sem esse atendimento não há justiça.

Portanto, aqueles que não conservam as diretrizes estabelecidas no Estatuto das Cidades permitem que haja uma desigualdade entre os cidadãos, pois alguns serão atendidos de modo satisfatório enquanto outros sofrerão o descaso no tocante ao meio ambiente artificial. É necessário que os governantes municipais sejam capazes de entender que a distribuição de recursos devem ser pautada na ética e no respeito, não a si próprios e a seus interesses, mas a todos aqueles que habitam no local que esteja sendo aplicados.

2. OS PRINCÍPIOS DA POLITICA URBANA APLICADOS A AUTONOMIA DO MUNICIPIO SOB A ÓTICA DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988

A Constituição Federal de 1988 é inspirada e regida pelo caráter democrático e os princípios esculpidos na Política Urbana expressa a ideia de bem comum e uso coletivo, de modo que todos possam usufruí de modo igualitário os recursos e bens da nação. Assim, nos artigos 182 e 183 da Constituição Federal, temos o Estado Social com o intuito de proteção, além dos direitos fundamentais que garantem aos cidadãos do município a sobrevivência e dignidade, sejam eles expressos nos direitos de primeira, segunda ou terceira geração. Além disso, no que tange os direitos de terceira geração – aqueles que abrangem a sobrevivência e a dignidade juntamente com os ideais de solidariedade – possuem a visão a proteção ao meio ambiente, ao patrimônio comum da humanidade, à comunicação, à paz e a qualidade de vida individual e coletiva.

A política de desenvolvimento urbano, a qual possui os objetivos impostos pela Constituição de ordenação do desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar da sociedade conforme o artigo 182 da carta magna. Se fizermos uma comparação no que toca a garantia do bem-estar social, iremos ser reportados ao art. 225 do texto constitucional. Este artigo enuncia que todos tem o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, sendo o meio ambiente um bem comum e essencial a saúde da população, impondo que cabe ao Poder Público e à coletividade garantir a sua existência para que as futuras gerações possam usufrui da mesma forma que as gerações passadas.

Portanto, ambos os objetivos que também podem ser considerados como princípios que devem se cumprir através da Política de Desenvolvimento Urbano, possuem uma intima relação com os direitos fundamentais e também com os direitos sociais constantes no art. 6º da Constituição. Assim, o Município se torna um agente executor de políticas de direito a todos os cidadãos e o responsável por assuntos como moradia, transporte e lazer, correspondentes as funções essenciais da cidade e para cumprir com os cuidados do Estado Social. Esse modelo de desenvolvimento expressa um outro principio que está esculpido nas linhas e nos conceitos do Estado Social, qual seja o desenvolvimento sustentável.

Em linhas gerais, o desenvolvimento sustentável possui como premissa a melhor interação entre o desenvolvimento tecnológico e uso dos bens naturais preservando o meio ambiente como uma espécie de equilíbrio. Diante disso, o desenvolvimento sustentável urbano – uma espécie de desenvolvimento pautado na sustentabilidade e o direito urbanístico – possui um equilíbrio entre o crescimento econômico, a inclusão social, o igualitário rateio das riquezas, uso sustentável dos bens naturais, preservação ambiental e solidariedade. Portanto, podemos confirmar essa ideia de equilíbrio apresentado pela Constituição Federal através do Estatuto das Cidades e Estatuto da Metrópole, garantindo por meio da enunciação dos direitos das cidades a sustentabilidade como diretriz geral da política urbana nacional.

Por fim, esses princípios podem ser revistos na obrigação imposta ao Município de executar e criar os melhores instrumentos para se aplicar a política de desenvolvimento e em sua autonomia perante os entes federados. Assim, podemos perceber que através da hierarquia de leis, os objetivos das leis federais para as cidades são derivados dos ideais constitucionais com a visão ampla de satisfazer e garantir os direitos e anseios da sociedade local.

3. O IMPOSTO PREDIAL TERRITORIAL URBANO E SUAS GENERALIDADES

A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 156, inciso I, autoriza aos municípios a instituição de impostos sobre a propriedade territorial predial e urbana. Essa autorização garante ao proprietário o direito que este possui como características básicas: usar, gozar, dispor e reaver. Desta forma, podemos conceituar o Imposto Predial Territorial Urbano, mais conhecido como IPTU, sendo o imposto que anualmente é cobrado a todos as propriedades com construção no meio urbano municipal. Em outras palavras, é cobrado a todos os proprietários comerciais nas cidades, seja casa, prédio comercial ou terreno que haja alguma construção.

Esse imposto é calculado sobre o valor de venda dos imóveis e é o mesmo valor que caso haja uma desapropriação ou penhora nos imóveis afetados. É importante ressaltar que casa haja uma inadimplência no pagamento deste imposto, o nome da pessoa a qual foi emitida o crédito tributário vai para a Dívida Ativa. Esta, por sua vez, se trata de um cadastro feito pelo Poder Público – seja ele municipal, estadual ou federal – para os contribuintes que estejam em débito. Essa inscrição é realizada pela procuradoria-geral do município a pedido da prefeitura e pode ter como consequências para os inscritos a restrição para novos empréstimos e inclusão do CPF ou CNPJ em cadastros de devedores como o Serviço de Proteção ao Crédito (SPC) ou Serasa.

O IPTU está explicito na Constituição Federal e é importante ressaltarmos que ele pode ser cobrado tanto de pessoas físicas quanto de pessoas jurídicas, haja vista que o imposto incide sobre prédios comerciais e habitacionais. Além disso, toda a regência deste imposto é abrangida pelo Código Tributário Nacional, representado pela Lei 5.172 de 1966. Basicamente, o objetivo principal do imposto em estudo é obter recursos para o governo municipal de modo que também se tenha um meio para controlar os preços das propriedades.

Mas caso exista no meio urbano alguma propriedade que não tenha nenhum tipo de construção, os proprietários serão obrigados por lei a pagar apenas o ITU – Imposto Territorial Urbano. De semelhante modo, aqueles que não residem em cidades, mas em propriedades rurais ficam obrigados a pagar o ITR – Imposto Territorial Rural mesmo que nessas localizações não haja construção predial. Desta forma, instado a se manifestar sobre esse entendimento o Superior Tribunal de Justiça, decidiu sobre validade do art. 15 do Decreto-Lei 57/66 em sede de incidente de demanda repetitiva da seguinte forma:

“TRIBUTÁRIO. IMÓVEL NA ÁREA URBANA. DESTINAÇÃO RURAL. IPTU. NÃO-INCIDENCIA. ART. 15 DO DL 57/1966. RECURSO REPETITIVO. ART. 543-C DO CPC. 1. Não incide IPTU, mas ITR, sobre imóvel localizado na área urbana do Município, desde que comprovadamente utilizado em exploração extrativa, vegetal agrícola, pecuária ou agroindustrial (art. 15 DL 57/1966). 2. Recurso Especial provido. Acórdão sujeito ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução 8/2008 do STJ”. (REsp 1112646/SP, Rel Min. Hernan Benjamin, Primeira Seção, Julgado em 26/08/2009, Dje 28/08/2009)

Diante disso, a Corte compreender que o decreto em comento foi recepcionado como lei complementares, razão pela qual não há ofensa ao que contém disposto no CTN. Muito se tem discutido sobre esse imposto, principalmente no que toca a ideia de onde ele pode ser aplicado ou em que tipo de prédio pode ser cobrado. Em alguns casos, houve discussão se era possível cobrar o referido imposto de casas designadas para a residência de algum sacerdócio. Em 2015, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro em sede de apelação entendeu que:

“DIREITO CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO. IPTU. PRÉDIO DE PROPRIEDADE DE INSTITUIÇÃO RELIGIOSA. IMÓVEL UTILIZADO PARA RESIDÊNCIA DE SACERDOTE. Ação proposta instituição religiosa objetivando a declaração de imunidade tributário, bem como a repetição de indébito em face do MUNICIPIO DO RIO DE JANEIRO a alegar que o imóvel que lhe pertence serve de moradia para os sacerdotes, portanto não passível da incidência de IPTU, por gozar de imunidade tributária. Sentença de improcedência. 1. O art. 150, VI, b, da CFFB é claro ao estabelecer que a imunidade tributária aos tempos de qualquer culto, inexistindo respaldo para que seja estendida aos prédios destinados à moradia dos sacerdotes. 2. Recurso ao qual se nega seguimento, na forma do art. 557, caput, do CPC.” (APL 0388151-46.2009.8.19.0001; TERCEIRA CAMARA CIVEL; DES. Fernando Foch de Lemos Arigony da Silva, DOU 05/05/2015, JULGAMENTO 11/02/2014).

Neste julgamento do Desembargador Fernando Foch de Lemos Arigony da Silva, a aplicação tributária nos templos religiosos foi expandida para os impostos municipais, dos quais deve-se atentar que nem todos os prédios localizados no meio ambiente artificial da cidade é passível de cobrança do Imposto Predial Territorial e Urbano – IPTU. O artigo 32 do Código Tributário Nacional nos apresenta algumas linhas gerais sobre o IPTU, vejamos:

Art. 32. O imposto, de competência dos Municípios, sobre a propriedade predial e territorial urbana tem como fato gerador a propriedade, o domínio útil ou a posse de bem imóvel por natureza ou por acessão física, como definido na lei civil, localizado na zona urbana do Município.

Segundo essas linhas gerais é importante ressalvar que para que haja o critério material do imposto e necessário que a pessoa a ser cobrada seja o proprietário, ou seja, ter o domínio útil ou ser possuidor do imóvel predial e territorial. Portanto, devido a divergência de entendimentos o Supremo Tribunal Federal, entendeu que a tributação do domínio útil e da posse, apesar de a Constituição se referir à propriedade.

Também devemos compreender que ao estabelecer as normas gerais do IPTU, permitiu aos Municípios definir o que se deve entender por zona urbana para fins deste imposto, de modo que é necessário se atentar aos critérios estabelecidos como: meio-fio ou calçamento com canalização de água; abastecimento de água; sistema de esgotos sanitários; rede de iluminação pública, com ou sem posteamento para distribuição domiciliar e escola primária ou posto de saúde a uma distancia de até 3km do imóvel. Tudo conforme os parágrafos e incisos do dispositivo jurídico em comento.

4. O IMPOSTO PREDIAL TERRITORIAL URBANO PROGRESSIVO PELO TEMPO COMO INSTRUMENTO DE POLITICA URBANA NOS MUNICÍPIOS

A própria Constituição Federal, em seu artigo 182, §4º, faculta ao Município a aplicação de uma espécie do imposto em estudo. Para tal, esse tipo de IPTU é utilizado como uma sanção, de modo que o Município, mediante lei especifica, pode exigir um aproveitamento do imóvel para o proprietário, tanto que se caso não seja obedecido o pedido é passível da aplicação da sanção.

O objetivo desse tipo de sanção é a preservação da função social da propriedade, tanto que não é possível a sua aplicação em casos que fogem dessa premissa. Neste tipo de sanção, o descumprimento das exigências impostas pelo Município ou dos prazos previstos permitem a aplicação do IPTU com progressividade no tempo, mediante uma majoração da alíquota e estipulado pelo prazo de cinco anos consecutivos.

Por ser pautado na função social da propriedade, o parcelamento, a edificação ou a utilização compulsória são obrigações dos proprietários de imóveis urbanos. Passam a fazer parte dos instrumentos de aplicação sucessiva passiveis da aplicação do IPTU progressivo. Cabe ao Município, mediante o que consta no Plano Diretor promover as notificações de parcelamento, edificação ou a utilização compulsória os quais delimitarão as circunstâncias e a abrangência desse instituto que além de ser uma obrigação é um instrumento da política urbana de desenvolvimento.

É importante ressalvar que essa progressividade não pode se confundir com a seletividade e progressividade fiscal apresentados pela Constituição Federal em seu art. 156, §1º, incisos I e II. Possui um caráter extrafiscal, visando os objetivos da política urbana e sendo como um instrumento de sanção caso o Poder Público Municipal perceba que algum imóvel urbano não se enquadra com as diretrizes e normas gerais esculpidas no Estatuto das Cidades.

Para a sua aplicação existem critérios que devem ser observados: apenas para imóveis não edificados, não utilizados ou subutilizados. Diante disso, podemos concluir que para aplicação dessa espécie de sanção-imposto, se faz necessário que além do preenchimento dos requisitos legais se devem atentar para os requisitos sociais. Assim, os requisitos de aplicação do IPTU progressivo visam equilibrar dois grandes princípios, quais sejam o da função social da propriedade e o da vedação da utilização de tributo com efeito confiscatório. Não seria apenas a punição o objeto, mas também o cumprimento da política de desenvolvimento social.

Desta forma, FRANCISCO e GOLDFINGER (pág. 52, 2017) de modo resumido nos permite uma melhor concepção do IPTU progressivo como instrumento político urbano:

“O IPTU progressivo em razão do tempo, de caráter extrafiscal, é o disciplinado no Estatuto da Cidade, tratando-se um instrumento de política urbana para obrigar o proprietário do imóvel a parcelar ou edificar o imóvel, para se adequar à ordem urbanística prevista no plano diretor. Em outras palavras, não tem por objetivo aumentar a arrecadação do Poder Público, mas de fazer o proprietário cumprir os objetivos definidos no Estatuto da Cidade, promovendo uma adequada destinação a seu imóvel”. (FRANCISCO E GOLDFINGER, pág. 52, 2017)

Diante disso, o IPTU progressivo tem duas premissas finais de utilização: imóvel contrário ao plano diretor ou descumprimento da obrigação de parcelamento ou de edificação. A adoção do IPTU progressivo é obrigatória pelo Município, uma vez que não há em que se falar em discricionariedade para o administrador municipal, atuando de forma vinculada.

CONCLUSÃO

Assim, podemos compreender que o IPTU progressivo, sanção imposta por descumprimento das aplicações legais anteriormente faladas, é um instrumento da política de desenvolvimento urbano da qual possui o objetivo de garantir os direitos sociais, fundamentais e coletivos. Não é apenas um instituto sancionatório como forma que assegure a efetiva organização e desenvolvimento da política urbana, mas sim como uma ferramenta que o poder municipal, no uso de suas atribuições, possui para que seja assegurado o meio ambiente equilibrado e sustentável para todos.

Portanto, para que haja uma efetiva forma de atuação para o cumprimento de todos os preceitos estampados nas leis em estudo se faz necessário que não apenas o ordenamento jurídico se preocupe com o meio ambiente urbano, mas que todos os habitantes da sociedade tomem para si o dever se cuidar e zelar pelo espaço público de forma que quando divididas essas tarefas haja uma cooperação entre todos: Poder Público, sociedade e leis.

O presente trabalho é uma análise de conhecimento que demonstra que não adianta apenas a lei possuir institutos dos quais não são aplicados ou conhecidos. Se formos perguntar a sociedade sobre esse instituto, muitos nos responderiam que não o conhecem, pois falta o conhecimento e a fiscalização. Muitas vezes o Poder Público somente cobra mas não faz campanhas educativas capazes de mostrar a sociedade a real necessidade de cuidado.

Diante disso, para que possamos ter a efetividade do IPTU progressivo como ferramenta urbanística asseguradora da função social da propriedade não é suficiente apenas o lado legal como falado mas que haja políticas publicas efetivas onde o poder público incumbido de executar possa conseguir criar estratégias capazes de englobar as mudanças sociais através de uma concepção de sociedade interativa para que todos saibam os seus direitos e deveres, de modo que possamos progredir como uma nação.

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Artigo escrito por:

Orsini Pereira Castelo Branco: Acadêmico finalista de Direito pelo Centro Universitário Luterano de Manaus – CEULM/ULBRA. Email: orssaor@gmail.com.

Rubens Alves da Silva: Professor orientador da disciplina de Trabalho de Curso em Direito do Centro Universitário Luterano de Manaus – CEULM/ULBRA. Bacharel em direito, Advogado, especialista em processo civil judiciário, especialista em docência e gestão do ensino superior, mestre em direito pela FDSM, autor de livros. Email: Rubens.silva@ulbra.br


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